17.1.10

Capítulo 1: Benvindos a Andaluzia.

“Estava no departamento, tinha acabado de instalar a porta com mais trancas que eu já vi. Só não era mais pesada que a porta de um cofre. Era composta por duas chapas de madeira e no meio uma chapa de aço, ele agradecia por ser o dono. Pelo menos, no prédio, ninguém reclamava. Tenho que me focar frente o computador. Tenho que achá-los, afinal, é por isso que eu estou aqui...”

Atenção senhores passageiros, os bancos de cor laranja são destinados a gestantes, pessoas deficientes, idosos e pessoas com criança de colo. Seja solidário, ceda o lugar.” – Dizia assim a voz onipotente do trem que outorgava a maneira comportamental e via o futuro pré-programado, mas só havia uma pessoa no metrô, e ela estava sentada no banco laranja.

Um homem de terno azul alinhado com a gravata frouxa na mesma cor, mas ao contrário do estereotipo, não tinha o cabelo preso no gel, mas sim um cabelo cacheado e desgrenhado, acompanhado de seu terno amassado. Tinha uma pele morena com uma barba rala, fraca e mal feita. Ao seu lado esquerdo, em um banco esquerdo tinha um envelope pardo com algum conteúdo. Enquanto olhava para dentro do enorme copo de café de 600 ml vazio.

Olhava em seu celular, de algum modelo antigo que praticamente tinha um buraco no meio que não havia chegado ao visor, que horas eram. Faltavam uns 3 minutos para uma hora da manhã, e seu celular sem sinal. Não era tão surpreendentemente assim, o metrô da cidade de Andaluzia era algo fenomenal, um feito na sociedade de hoje. Um metrô à prova de terremoto, furacões, incêndio, ataques terroristas, dentre outros acidentes e catástrofes, mas o problema é que no Brasil não há catástrofes desse tipo, pelo menos não em Andaluzia. O povo daquela cidade compensava qualquer catástrofe.

Não que todos aqueles que nascem ou residem em Andaluzia tenham grande tendência a não se livrar de traumas ocorridos, tanto que a cada dez pessoas em Andaluzia, sete fazem terapia. É praticamente o “hobby municipal”, e os que não praticavam eram todos marginais, claro que havia suas exceções, mas eram muito poucas. E o nosso passageiro não era exceção, pelo menos, não esse tipo.

Andaluzia era duas cidades em uma: a diurna que era um real pulsar de vida, com todos trabalhando, aprendendo, dentre outras atividades dignas de sociedade. Como qualquer outra cidade do mundo. Mas de noite em Andaluzia aconteciam coisas bizarras, os mesmos contos que assustam as crianças assustam os adultos. Já havia se criado a idéia de quem vive da noite era um mau-caráter. Coisa que não deixava de ser verdade, sempre esses turnos eram deixados para os mais desagradáveis, inclusive o maquinista do metrô, que estava ali sempre por atrasar no horário diurno, causando quase um choque entre duas locomotivas.

Os dias eram para as pessoas do bem, a noite não era para pessoas fracas, ou mesmo com consciência que não se deixa dormir a noite. Nosso passageiro de azul marinho tinha ainda consciência, mas era quase calada pelo café e seus serviços.

Estação Águia de Haia, desembarque somente pelo lado direito. Next Stop, Águia de Haia Station”. Era uma da manhã em ponto, ele se levantava antes do vagão parar e jogava o enorme copo de café no lixo. E voltava para seu banco laranja. Um segundo antes de sair do túnel escuro e a luz da estação invadir, deixando transparecer que o mundo estava acelerado, mas na verdade tudo está como deve estar e sim o observador que estava correndo, acelerado. Esse era o estilo de vida em Andaluzia, correr para ter tempo mais tarde.

As portas se abriam emitindo uma campainha irritante era melhor isso do que cair completamente no trilho do trem de surpresa. E mais uma alma entrava na víbora de metal, assim como o passageiro de azul marinho, de cabelos cheios de gel e bem alinhados. Um verdadeiro executivo, mas ele estava enormemente suado, mesmo com o ar-condicionado central ligado. Com uma maleta e com as mãos trêmulas, sentava do lado do passageiro ali há mais tempo.

O empresário sentava no banco verde adjacente ao banco laranja do passageiro, o homem de terno preto estava nitidamente nervoso e suava frio com o ar-condicionado central do metrô, enquanto outro estava tranqüilo, de cabeça baixa como se nada o abalasse.

O homem que acabara de entrar, era Carlos Almeida. Um empresário e corretor da bolsa, que misteriosamente sabia sempre de quais empresas que o favorecem e sempre sabe quando alguém vai ter problemas, e esse “sentido” apitava freneticamente para ele mesmo.

-Senhor K? – O novo passageiro do vagão se referia ao primeiro, falava com uma voz trêmula, como se tivesse medo daquele homem, coisa que ele realmente deveria ter mesmo sendo o prestigiado senhor Almeida. Nada estava muito além de um chantagista profissional.

-Fique calmo, Senhor Almeida. Não temos que transformar isso em apenas negócios e dever, se não meu dever seria enviar isso às autoridades competentes, não acha?! –o Senhor K. mostrava o envelope pardo dentro do blazer, cheio de papeis. – O que o senhor acha sobre aquilo?

O chantagista apontava para a TV que mostrava clipes, o mapa climático, mas naquele momento anunciava sobre um fato de alucinação em meio ao Japão, que habitantes diziam que viam monstros pelas ruas, e jovens que disparavam energia multicolorida para eliminá-los. Nada confirmado pelas autoridades locais, sempre dando desculpas esfarrapadas.

-Acho pura besteira, monstros atacando a vida real? Apenas acho que eles apenas usaram muita droga. –O Senhor Carlos apenas falaria o que achava, até que percebeu que poderia ser um daqueles jogos de “se você concordar comigo, você vive, senão...”, e rezava para que aquela resposta o satisfaça.

-Assim como a vida na terra é baseada no carbono, ao que parece o Silício tem a mesma propriedade de fazer ligações com qualquer outro elemento, mas por pura inércia ou fatores que desconheço isso não é possível. E os próprios físicos acham que as forças da natureza foram traçadas com algum raciocínio, e não ao caos total, o que pode ser que tudo tenha uma explicação nessa vida, ou não?! –Carlos suou frio, além pela resposta errada, via o coldre de tronco do chantagista e onde há um coldre há sempre uma arma. –Mas eu também acho que é lorota, mas vai saber, não é?!

Carlos não sabia o que fazer, não podia saber se “K” era apenas um assassino, mas o sujeito tinha provas de que ele era um corrupto que seqüestrava filhos de grandes empresários para manipulá-los. Apesar de não acreditar no primeiro instante, mas quando recebeu uma ligação do contato que “sujava as mãos” que estava baleado e que duas horas depois a polícia havia descoberto o cativeiro. Queria ter levado um segurança, mas se levasse àquele que se diz o “senhor K.” iria matá-lo e incriminá-lo, e com certeza iria fazer, tinha olhos firmes.

-Aqui está, 30 mil reais em notas não marcadas, os documentos do meu carro roubado, e a apólice de transferência. Agora, por favor, me deixe em paz. Esta tudo aí como você pediu. –Ele entregou a maleta com tudo, e o homem de blazer azul apenas abria a mala e conferia tudo para logo depois fechá-la. –É, realmente está tudo aqui, mas só tem um problema.

O coração do executivo-sequestrador parou, aquele momento era aterrador, até mesmo o metrô que voava como um Concord apressado parava. Sua respiração doía e seu coração congelava, suava e não conseguia engolir sua própria saliva.

-Vou ter que falar para sua mulher que você anda cometendo adultério com a recepcionista da tarde na Bolsa de Valores. E sinceramente, ficar iludindo uma mãe solteira de dois filhos, sabendo que a sua própria filha está com dificuldade em matemática, sinceramente, isso é decepcionante para um homem. –Carlos não acreditava que ele sabia tanto de sua família e rotina. – Exato, fui contratado por sua esposa por que ela queria saber o porquê de você chegar tão tarde. Só que eu fiz meu trabalho um pouco melhor do que o esperado. E recomendo não ter a infeliz idéia de me caçar, pois como deve presumir você não é o único que eu tenho podre e se eu por acaso morrer ou sumir, alguém muito simpático vai espalhar os podres de todo mundo. Sabe aquela história de “se eu morrer levo muita gente comigo...” pois é...

O sorriso de sarcasmo de como um jogador de xadrez consegue colocar o adversário em uma armadilha, coisa que Carlos fazia com as suas vitimas, o que lhe deixava inseguro e nervoso. Provavelmente nunca mais faria isso, e mesmo assim, ele já teria algo para que se preocupar, afinal ele tinha provas, datas, locais e fotos.

Estação oito de dezembro, desembarque somente pelo lado direito. Next stop Oito de Dezembro Station.

As portas se abriam, o “senhor K.” se levantava com a mala e deixava um envelope de papel pardo no banco. E descia da serpente de metal, deixando o Senhor Almeida com a cópia de algumas provas que possuía, só aquelas que ele não poderia apagar.

*****

Ao metrô sair e ser devorado pelo túnel, o chantagista enfiava a mão do bolso pegando o seu celular. Abria-o e via que era meia-noite e dezesseis, e conferia ainda o sinal do celular que indicava “Sem Serviço” e era por isso que ele freqüentava o subsolo de Andaluzia, gostava mais ônibus, porém não iria querer que seus “clientes” chamassem seus “seguranças”. Naquele horário, queria mais passar despercebido, e via que a estação oito de Dezembro era um deserto, exceto por ele, alguns orelhões e câmeras de vigilância, as quais não gravam e o vigilante estava dormindo.

Ia para a fileira de orelhões para ligar, procurando um número na agenda do celular e com a outra tateando outro bolso que estava o cartão telefônico, enquanto prendia o valioso pagamento no meio das pernas. Esperava encontrar alguém acordado para lhe dar carona, senão teria que ficar mais um tempo. Preferia ficar no subsolo de Andaluzia a desafiar sua noite.

Até que o silêncio primordial da sagrada Oito de Dezembro foi quebrado por uma conversa com vozes femininas, altas e divertidas. Em Andaluzia, isso era praticamente impossível, já que era o mesmo de pedir para ser assaltada, na melhor das hipóteses. Voltava a se concentrar no telefonema, mas era difícil.

Olhando com mais atenção, viu duas jovens. Uma era baixa, caucasiana e ruiva, com um aparato de fotografa, como tripé e uma câmera profissional de 35 milímetros, tinha certa firmeza em seus passos e olhos curiosos que não paravam buscando algo para fotografar. Já a outra tinha um jaleco, como uma médica, mas carregava mais uma mochila comum de estudante, esta uma morena, alta e tinha gestos e movimentos esguios. Eram figuras antagônicas, porém coexistiam alegremente.

O que era uma visão que alegrava um pouco a vida do vigarista do submundo de Andaluzia. Cenas como essa, que alguns seres da noite de Andaluzia acreditavam que ainda havia esperança para essa Idade das Trevas. Tanto que chegava a criar-lhe um sorriso na face, e o próprio não queria que elas fossem a capa do jornal, sendo mais uma estatística para Andaluzia.

Decidira que iria acompanhar as damas, afinal em Andaluzia todos podiam ser Anjos ou Demônios, e por que ele não poderia ser os dois? Ouvia o metrô chegando, junto com a sua luz. Guardava seu cartão telefônico e seu celular, pegava novamente sua mala e ia em direção à linha do trem. Sem ao menos elas perceberem, pois estavam incrivelmente entretidas em sua conversa.

Ele entrou no vagão seguinte ao que as jovens entraram, o qual estava vazio, apoiando-se na porta de ligação para não perdê-las de vista. Porém, por mais que quisesse vigiá-las, não conseguia tirar os olhos da morena de jaleco. Ela era quase hipnotizadora para ele, nem era pelas curvas de seu corpo que lhe chamavam atenção, mas sim um olhar escuro que refletia toda luz, como se tudo que o visse estivesse cheio de vida. Era inebriante.

Atenção senhores passageiros, os bancos de cor laranja são destinados a gestantes, pessoas deficientes, idosos e pessoas com criança de colo. Seja solidário, ceda o lugar.

-Olá, amigão. Tem fogo aí? – Uma voz vinha direto de trás do dito “Senhor K.”, e pela silhueta da pessoa era um homem gigantesco, com uma camisa de algum time de futebol. De cabelo cortado apenas com uma máquina, não era o tipo de pessoa com quem você queria encrenca, então por que não oferecer o que ele queria?

-Ok, só um momento. –Ele enfiava a mão para dentro do Blazer, tateando enquanto se virava para olhar para o individuo pessoalmente.

De repente, um movimento brusco do vigarista/anjo da guarda, ao invés de algum isqueiro ou fósforo, vinha uma Glock 17, a arma que sempre vive presa ao seu peitoral, e ao mesmo tempo ele se abaixa. Pois o movimento contrário do torcedor do rubro-negro do litoral era seu punho descomunal acompanhado de um braço que parecia que suas veias iriam explodir.

O soco não alcançou, mas quebrou o vidro da porta, em compensação o disparo feito às pressas não acertou como devia acertou mais uma das janelas temperadas do metrô que explodia em vários pedaços, mas o tiro não foi de todo inútil, raspou a orelha que fazia vazar um sangue de um verde doentio, mas logo seu antebraço o qual estava com a arma foi pego e começava a ter um toque cáustico, fazendo aparecer uma fumaça negra e o cheiro de queimado, vindo da manga do blazer. O que causou meio que um susto em senhor K, que começava a se desesperar.

A primeira idéia dele foi a mais óbvia e covarde para um homem: chutar a genitália alheia. Na sua cabeça, ambos estavam quites, já que ele derretia coisas com a mão e tinha o seu braço nela, mas mesmo sentindo dor continuava a acertar. Decidiu trazer o oponente mais para si, fazendo-o perder um pouco de equilíbrio e dando mais a ele, já que agora ele estava apoiado na porta. E com força e rapidez, chutou o torcedor cáustico para longe, fazendo cair completamente no chão.

Ele pensara em bater com a mão livre, mas se o toque fazia aquilo, imagina o sangue que escorria da sua orelha. O que se provou verdade, pois algumas gotas produziram uma fumaça quando tocou no chão do metrô. Quando o agressor começava a se levantar, via as veias do pescoço, assim como o próprio se dilatar. E “K.” não queria ficar para descobrir o que era, ele pegava a mala e passava por cima dos bancos, correndo para o vagão oposto de onde estavam as jovens. E apenas corria com toda velocidade para o próximo vagão, querendo distância daquele monstro em forma humana.

*****

O torcedor-cáustico se preparava para cuspir ácido no infeliz e em metade do vagão, mas engolia tudo novamente porque esse tipo de ataque consome suas energias, e suas ordens eram de eliminá-lo a qualquer preço. Engolia novamente a enorme quantidade de ácido e se levantava, apenas vendo seu alvo correr para o próximo vagão, e ele só teria mais dois antes dele conseguir de alguma maneira sair do metrô, então se colocava a correr.

Seu alvo fazia questão de fechar a porta e não de trancá-la, talvez fosse o medo, talvez fosse burro, mas de qualquer maneira quando alcançá-lo ele seria apenas uma poça de gosma na melhor das hipóteses. Quando chegava ao outro vagão, ele já tinha ido para o outro.

Atravessava correndo o outro vagão, esperando encontrar sua vítima do lado de fora do metrô, na cabine traseira. A qual estava trancada, então tocava na fechadura para derretê-la. Achava que seu alvo estava escondido, como uma criança na cabine do maquinista chorando de medo. Até que ouviu um estampido e o mundo escureceu.

“K” estava apoiado na parede no final daquele vagão, o qual o torcedor sumariamente ignorava e passava direto para a cabine do maquinista. Bastou apenas um tiro de sua arma para eliminá-lo, agora era o simples fato de revirar seus bolsos, pegar seus pertences e saber que era o infeliz. Porém notou que no momento presente não seria possível, pois o corpo começava a derreter transformando-se em uma gosma ácida que derretia o chão. E presumindo a velocidade do trem e o acontecimento seguinte, corria para a locomotiva do metrô.

*****

Entre uma conversa e outra, as amigas matam a saudade uma da outra, pois agora com ambas seguindo caminhos diferentes. Uma cursando Biologia e a outra estagiária de Publicidade, no Pauta Livre News, era bom elas se encontrarem depois de três meses sem se ver. Fernanda, a publicitária-fotógrafa, havia convidado ela para uma festa, na qual ela poderia levar um acompanhante, a qual foi Cristiane, a futura bióloga. Tudo que tinha que fazer era tirar fotos do evento, o trágico que mal deram conta, já estava naquele horário, quando Andaluzia era intransitável. E sem táxis por perto, por que não se aventurar na malha ferroviária-subterrânia de Andaluzia?

Tudo era deserto, até mesmo as catracas eram eletrônicas, só havia um atendente que estava dormindo na cabine de compra de passagem. Só encontraram de relance mesmo, um homem telefonando em um orelhão que não parava de olhá-las, mas não tinha cara de ser perigoso ou muito menos ameaçador, parecia apenas curioso. Carregando a maleta, ele foi esperar o metrô como elas, mas entrando no vagão adjacente ao delas.

E discutiam sobre uma e a outra, cultura pop, suas atividades, dentre outras coisas... Até que um estampido de tiro e janela quebrada soaram como tempestade de dentro do metrô. Ambas se jogaram para o chão do metrô, e um momento de silêncio permaneceu no ar.

-Tá vendo, eu devia ter ligado pra alguém vim buscar a gente! –Gritava a publicitária em pânico por ter ouvindo um tiro no dito “transporte mais seguro de Andaluzia”.

-Pelo menos só foi um, imagina se fosse mais... Ou que estivéssemos na rua?! –A estudante de Biologia, ia em direção da sua bolsa maior. Tirando dela um arco olímpico, cheio de aparatos de mira e estabilidade, enquanto colocava a corda no arco rapidamente, e em seguida tirava uma flecha e com ela tencionava o arco. Colocava-se a mirar para a porta na qual ouviu o barulho do tiro.

-Você ainda faz arqueria? Porque não comprou uma arma logo?! – dizia Fernanda ainda abaixada.

-Você acha mesmo que meu pai e minha mãe iriam me deixar ter uma arma? Té parece! Tive que chorar para aprender arco e flecha. –Cristiane dizia isso ajoelhada, fazendo mira onde o ombro do indivíduo iria aparecer, não iria matar, mas com certeza não deixaria qualquer maluco com uma arma fazer qualquer coisa com ela ou com sua amiga.

-E porque não fez defesa pessoal? –Fernanda já começava a conversar com um tom mais calmo, porém com o coração ainda acelerado.

-E eu tenho cara de ficar agarrada com alguém?! E suada?! Me poupe, né amiga! Sou uma Lady! –Cristiane distenciona a corda um pouco, achando que estaria tudo bem, mas mesmo assim não tira a flecha da corda.

Mas de maneira brusca e abrupta, a porta do vagão é aberta e a flecha voa, sem mira e sem precisão, mas na direção certa. E em um reflexo assustado, o homem sem nome desvia-se do projétil sentindo apenas a sensação de quase ser acertado.

Apontando a arma para sua atiradora, via apenas as garotas as quais decidira proteger. Naquele momento como vários outros, odiava cumprir sua palavra, mesmo quando ela era apenas pensada. Puxava-as pelo braço, mandava a morena pegar sua maleta, enquanto ele próprio pegava a mochila com as flechas e as bolsas das duas mulheres.

-Me sigam! –Ajudando levantar a freelancer, ele continuava a correr para o outro vagão. As duas ficavam um pouco para trás sendo guiadas e estavam perdidas e confusas.

-Do que estamos correndo? –dizia a arqueira correndo e puxando a amiga para acelerar o passo.

-Correr agora! Falar depois! –dizia o homem frustrado por não poder correr mais rápido por causa do peso e preocupado com as garotas.

Dez segundos depois da fala de “K”, a enorme quantidade de ácido finalmente havia perfurado o chão do metrô e se derramava pelas rodas, descarrilando o último vagão durante o pico de velocidade do metrô. Jogando de lado o metrô em um efeito dominó, e os três chegavam ao vagão da locomotiva. Os três últimos ficam apenas inclinados, mas impossibilitados de andar. O metrô freiava repentinamente, causando uma parada lenta e desajeitada, com um ruído que arrepiava a espinha.

Mesmo com o acidente, K continua em pé, por conseguir se equilibrar e firmar no chão com o peso adicional, mas suas duas protegidas caem sentadas nos bancos. Ele batia na porta do maquinista, na primeira vez não ouviu nada. As duas finalmente olhando para trás, viam os vagões inclinados e quanto mais longe estavam mais inclinados eles pareciam.

-Vai amigo, abre a porta! –dizia K. batendo mais forte na porta que não tinha maçaneta pelo lado de fora, não ouvia voz, mas quase era possível ouvir a respiração pesada e ofegante.

-Ei! O que houve? –perguntava a morena ao homem de blazer. -Dá pra finalmente explicar o que está acontecendo?

-Estamos presos em um único túnel, a menos que você seja contorcionista e queira deixar suas mochilas aqui, temos que sair pela janela da locomotiva. –Ele chutava a porta fazendo-a deslocar fortemente, mas com o exagero acabara de machucar o pé com o impacto. E praguejava alto, por sua recém-luxação.

-Mas podemos sair pela locomotiva traseira. –dizia a ruiva, meio tonta com tanta informação que acontecia.

-Se quiser arriscar de acabar de virar o peso os outros vagões e passar pelo ácido borbulhante que ficou no último vagão, além de vários cabos de eletricidade soltos durante o impacto, sinta-se à vontade. Primeiro as damas! –K, chutava normalmente a porta de modo seguro, onde as trancas ficavam, mas ainda assim não se movia. –E a estação mais próxima fica mais a frente.

-Claro, e aposto que isso não é culpa sua, não é?! Principalmente por eu ouvir um barulho de tiro e você aparecer com uma arma na mão correndo pra se salvar. –O homem puxava a arma, e olhava para a morena. Um breve momento de tensão, com a cara da ruiva ficou assustada, mas o olhar dos dois ficou firme.

-Nos salvar, né?! – K atirava na tranca da porta, destruindo a tranca totalmente e deixando a porta aberta. –Admito que seja minha culpa, mas se não quiser vir comigo tudo bem, mas acho bastante perigoso pra quem usa arco e flecha, ir para o outro lado.

Ele novamente atirava três vezes, para quebrar a janela da locomotiva do metrô. E entrava na área restrita do maquinista, e logo em seguida o barulho do vidro temperado caindo. Ele ainda voltava e pegava a mala da mão da morena.
-Se ainda quiserem minha companhia, peguem suas malas que eu vou primeiro para segurá-las, mas se forem para o outro lado cuidado com os trilhos eletrificados. Dez mil volts fritam borracha, cuidado. – E ele seguia novamente, e pulava para fora do metrô.

Para as meninas, as duas opções eram ruins, o maluco que atirava em tudo, mas que as salvaram ou seguir por um caminho perigoso e sozinhas. Cristiane de cara em um dia normal, iria pelo caminho indicado pelo homem depois dele ir, provavelmente com o arco na mão, mas sentia que no fundo ele estava ali para tirá-las das burradas que ele próprio fez. Estava bem decidido, e mesmo com o que aconteceu, ele parecia bem tranquilo. Em uma decisão estranha para ela, optou pela ajuda do estranho.

-Vamos, amiga! –Cristiane pega as bolsas e as mochilas.

-Vamos com aquele maluco como guia? –indagava Fernanda não acreditando na decisão da amiga de seguir um cara armado.

-Não sei, sei que é estranho, mas não dizem que as noites de Andaluzia são estranhas? –Puxava a amiga sentada no banco e lhe entregava sua mochila. A amiga que já sabia que quando ela colocava uma idéia na cabeça, ia atrás dela.

Ele esperou e quando achava que teria que pular de novo para dentro do metrô, o rosto angelical da morena aparecia lhe jogando as bolsas, as quais ele agarrava. Logo depois a ruiva descia com a ajuda de K e da morena, enquanto Cristiane descia sozinha, mas no último passo para descer, ela acaba deslizando, e para que não caísse, K. a agarra pela cintura.

Por um momento, ambos sentiram algo atravessar seus corpos, um tipo de arrepio que os deixava constrangidos e desajeitados, mas logo se soltaram ao perceber. Pegava as mochilas das jovens e carregava a bolsa de arquerismo da moça. Com a pistola novamente no coldre peitoral, já que percebia que isso as incomodava, acompanhar um cara com uma Glock destravada. E deixava a sua própria maleta com a morena.

-Ah, evitem encostar nos trilhos, se eu não me engano um deles te mata mesmo, o outro nem tanto. Mas por via das dúvidas, não pisem em nada de metal certo?! –Ele não olhava para trás, e com a única mão livre, ele começava e mexer no celular.

-Isso boa, idéia! –dizia Fernanda. –Vamos ligar para alguém vir nos buscar quando sairmos daqui!

-Eu ligaria se tivesse sinal. O subterrâneo de Andaluzia é o mais seguro possível, mesmo contra bombas, terremotos, enchentes, etc. Só que se esqueceram que não há nada disso em Andaluzia, e com tanto concreto que isso é feito, acho que nem mesmo um celular global funcionaria. –dizia como se fosse matéria básica do jardim de infância. –Tanto que alguns dos piores criminosos, principalmente aqueles que precisam de chip para serem rastreados, correm para cá para fugir!

-Nossa! Pra falar tudo isso, parece que você passa por isso uma vez por semana. –Cristiane fala tomando cuidado onde pisa, para não tropeçar nas tábuas.

-Pra falar sinceramente, vamos dizer que essa não é a primeira vez que “o pneu do metrô fura”, se é que você me entende?! –Continuava a mexer no celular freneticamente. –Digamos que eu tenho um pé-frio, sempre estou no lugar certo, e perto da hora errada.

-Ai, mas que diabos você mexe tanto no celular se ele não pega aqui em baixo? –dizia a ruiva agoniada.

-Ajustando ele pra usar a bateria como luz, afinal cada estação tem um telefone público. E sempre nas estações de metrô tem instrumentos de segurança, como coletes fluorescentes, botas, e capacetes com lanterna. E quem sabe um mapa se tivermos sorte...

A luz do celular abre um clarão muito forte, tanto quanto uma lanterna. Com o túnel escuro e tendo pouquíssimas luzes de guia para o metrô. E as garotas ainda ficam mais assustadas, não só pela segurança dele, mas também por ele já ter passado por essa situação mais de uma vez. Deixando ele ir na frente, guiando e levando a luz, ambas começam a conversar sobre aquele homem estranho.

-Estranho, né?! Ele passar por tudo isso, e ainda ficar tranquilo. E o pior, ele ter passado por isso mais que uma vez. E ainda estamos seguindo ele?! –Fernanda estava quase entrando em surto.

-Sei lá, sinto confiança nele. Ele parece tão seguro, acho melhor mesmo segui-lo do que acabarmos perdidas por aí. E por via das dúvidas, temos a mala dele. – Cristiane balançava a mala, com um sorriso sarcástico.

-O quê?! Meu equipamento fotográfico custa mais de cinco mil reais, e aquele seu arco cheio de penduricalhos. Aposto que você não ganhou na ação social! –Fernanda tinha razão, e Cristiane internamente concordava que ele sempre dava a maleta e pegava os itens delas. Quem fazia isso, geralmente é por que a mala não devia valer nada, ou era o último respiro de cavalheirismo em Andaluzia?

-Ei, você aí? – gritava Cristiane para o enigmático e estranho homem um pouco mais a frente. – Não vai se apresentar?

-Eu sou quem eu quero ser, o que é o suficiente pra mim e deveria ser o bastante pra vocês. – dizia o homem que carregava as malas. –Se quer meu RG, nesse momento posso te dar 3 diferentes.

-Aff... Não é assim que se responde. –dizia Cristiane, sendo puxada pelo braço de Fernanda como um sinal de reprovação.

-O que você ainda quer saber? O como eu devo pensar? O quanto vou durar? Ou se preciso casar? Humf... –De repente ele para, e olha para trás virando o rosto para as jovens. –Escolha um nome e um defeito e me dê. –terminando com um sorriso de sarcasmo no rosto.

-Ele é doidinho, não?! –Fernanda sussurrava no ouvido de Cristiane se levantando o máximo que podia e puxando o braço da amiga para baixo.

-Pode até ser... Mas no fundo no fundo ele tem razão. –Dizia no ouvido da amiga. - Do que adianta perguntar se nós não sabemos nada? Só sabemos que está armado e carregava essa mala, e que ele é um... er... “pé-frio”?! Ele pode falar o que quiser, cabe-nos acreditar ou não.

-Primeiro: quando é que você ficou tão filósofa? Segundo: quando é que você passou a confiar em pessoas estranhas? Terceiro: por que nós ainda estamos o seguindo? – Fernanda estava prestes a ter um surto psicótico. A sua melhor amiga estava fascinada por aquele maluco armado.

Antes que Cristiane abrisse a boca para falar, o barulho de algo caindo foi ensurdecedor naquele túnel. Ele jogara a arma no chão.

-Agora sou apenas um maluco, ok?! –Fernanda coloca a mão na boca, não esperava que ele ouvisse. – Sou Davis K. Hart, negociador freelancer e detetive particular. E da última vez que “o pneu do metrô furou” foi um sequestro o qual eu negociei. Feliz agora, moça?

O surto psicótico se tornou uma catalepsia, que a deixou em choque de Fernanda, e Cristiane bastante surpesas, suas reações eram quase cômicas. Andando um pouco mais a frente, elas pegam a arma que Davis jogara no chão. Fernanda a pega, sentindo o peso da arma que pesava mais do que ela imaginava, era complicado para ela pensar que era possível mirar aquilo com precisão.

-Er... amiga... é melhor nos apresentarmos. Já que confiamos nele, não é?! –Falava Fernanda para sua companheira.

-Não precisa Fernanda, já sei o bastante de vocês. –Davis largava as bolsas das meninas no chão. –Afinal, vi seus documentos e tudo mais que vocês carregam nas bolsas. – E na cara dele, um sorriso enorme, com todos os bolsos abertos, inclusive nécessaires, carteiras, dentre outros... –E felizmente encontramos os equipamentos de segurança de emergência.

-Ora... Seu... –Cristiane estava chocada e revoltada com o ato do homem a sua frente. E fica sem coordenar suas palavras e Fernanda com a boca aberta e queixo caído. –Mas que filho da...

-Óóóó... Xingar é feio! –Fazia Davis com seu dedo balançando em reprovação. –Moças bonitas xingando é muito feio, e cria rugas.

Ele ligava no telefone de emergência, mas afinava a voz para falar com o técnico do metrô que atendia aquela madrugada.

-“Ó moço, olha só! Eu e minha amiga estamos perdidas, nosso metrô quebrou e um maluco com uma arma enorme e pesada apareceu. Aí, moço!” –A voz era forçada e estridente, mas elas olhavam a atuação dele, e se assustavam que os gestos exagerados e exacerbados. –“Ele era um monstro, moço, eu to com a minha amiga aqui sozinha. E fomos assaltadas por ele. Estou nervosa, moço!”

Cristiane estava com uma cara chocada, e Fernanda queria acreditar que aquilo era um sonho.

-“Meu nome... Meu nome é Fernanda! Vem logo, moço! Que eu juro que lhe agradeço mais tarde.” – E desligava o telefone. – Bem, pelo menos ele vai vir rápido. E por favor, agradeçam ao rapaz como ele merece. E se não incomodam, tenho que levar suas coisas e a minha mala. –Na hora que ele tentava puxar a mala, Davis sentia resistência, Cristiane segurava firme a alça da maleta.

-Mas nem a pau, Juvenal! Como assim você vai levar as nossas coisas e sair assim na boa? –Os olhos da morena atravessaram os olhos de Davis com seriedade e o mesmo devolve.

-Bem, se querem aparecer com uma mala com 30 mil reais, apólices de seguros, e uma chave de uma BMW roubada. Além de uma arma com as digitais da sua amiguinha... E ainda levar a culpa de um trem descarrilado e atirar em propriedade do governo. Boa sorte! – Ele largava a mala, e ia em direção seguindo os trilhos.

- Tem as suas digitais na arma também! – gritava Fernanda nervosa.

-Tem não! –dizia com aquele sorriso irritante. –Uso base nas pontas dos dedos, não é muito ortodoxo, mas sempre funciona.

-Seu cretino! Você não pode fazer isso! – A arma que era de Davis agora estava apontada para ele, pela mão de Fernanda. –Esse equipamento é a minha vida, e você vai deixá-lo onde está! - A fotografa tremia de nervosismo e raiva.

-Bem, espero que pelo menos você saiba atirar com o poder da mente ou algo assim. Porque você iria precisar do pente. –dizia mostrando a munição da arma no bolso externo de seu blazer. –Além de atirar com uma arma travada. E o mais interessante seria você conseguir a munição de mim, colocar na arma, destravá-la e atirar letalmente em mim. Sabendo que AINDA tenho uma arma. –Abria um pouco mais o blazer e mostrava a Desert Eagle que estava no coldre preso ao seu cinto.

-Amiga, melhor abaixar isso. – Cristiane abaixava os braços da amiga que chorava copiosamente por perder todo seu equipamento. –Não vale apena...

-Que bom que pensa assim. - Puxava a mala da mão morena e depois a arma da mão da freelancer. – Não queria desfigurar o seu rosto, uma dessa é quase morte certa! No mínimo uma mão amputada, e não se preocupem, o técnico vai chegar logo. Dizem que quanto mais vocês dão, mais vocês recebem, inté qualquer dia!

Saia pelo túnel, deixando apenas os equipamentos de segurança, com elas e sumia na escuridão com as suas coisas.

*****

-Aquele cretino... Roubou praticamente tudo de nós, acredita? – Fernanda fala para o técnico do metrô que apenas olhava o busto e os quadris das duas, a ruiva estava desesperada em demasia para perceber isso, coisa que a morena já estava incomodada, queria ter aprendido defesa pessoal ao invés de arqueria naquele momento, para torcer o pescoço do técnico e daquele ladrão.

-Hamn... Sei... – O técnico nem se importava com aquela absurda história de um ladrão de terno ter roubado tudo delas, e nem com o trem descarrilado. Só fantasiava com as duas na casa de máquinas, ao mesmo tempo.

Chegavam por um atalho pelos corredores de manutenção, o companheiro do técnico que as acompanhava iria ver o que aconteceu com o veículo. E finalmente chegavam à estação, a qual era a que elas iriam parar a São João de Meriti.

Cristiane imediatamente liga para outra amiga a qual tem carro, para buscá-las, não queria encrencar-se e nem encrencar Fernanda. Tentava manter um pouco de razão com toda a raiva que tinha naquele homem que ela confiou em vão. Mas enquanto tentava lembrar-se do telefone da amiga, um homem descia, de jaqueta amarela e boné de alguma companhia de Táxi.

-Er... Desculpe... Estou procurando duas garotas: Cristiane Andallas e Fernanda Medina. –O homem era gentil e acanhado ao mesmo tempo, puro sinal de insegurança, meio calvo, com aparência de mais velho e bem alto. –Vim buscá-las.

-Uau, isso que é serviço! –dizia Fernanda olhando para amiga ainda com o telefone na mão.

-Vem cá, a pedido de quem você veio? –dizia a morena com o pé atrás.

-Um amigo em comum soube do acidente do trem e pediu pra eu vim buscá-las. E... Mandou entregar isso para a ruiva. –O taxista entregava uma flecha e uma nécessaire para a ruiva, as quais presumiam onde ele estaria. –Agora venham, por favor, essa é a hora que eu deveria estar dormindo.

Olhando entre si, as jovens aceitam a carona. Afinal, ele era mais frágil e ao que parecia não estava armado. Pelo menos, esse iria levar porrada até saciar a raiva da morena.

-Ei! E aquele agradecimento? –dizia o técnico.

-Peça ao cretino que roubou nossas coisas, foi ele que ligou. –dizia Cristiane subindo as escadas para a superfície.

Ao sair, a noite parecia escura, e os postes pareciam apenas iluminar os incautos e esconder os criminosos nas sombras. Estava com um resquício de chuva que já havia passado, com poças d’água rasas por todo o lugar e com um céu negro sem nuvens. E na frente da estação, o táxi amarelo da companhia Prometheus.

Dando uma corrida apenas para chegar no carro primeiro para abrir a porta de trás para as damas, assim como o protocolo de etiqueta manda. Ao entrar fecham os olhos por um instante para acordarem daquele pesadelo.

-Pelo menos, terão uma história para o final de ano! – A voz era conhecida, era Davis no banco da frente sorrindo com um copo enorme de café, que geralmente é o tamanho máximo para refrigerantes de cinemas. –Não se preocupem, suas coisas estão no bagageiro do táxi.

Cristiane ouvindo aquela voz e vendo aquele rosto, usa a flecha que carregava como uma adaga para quebrar o vidro e atingir o desgraçado, mas para azar dela ou mesmo sorte dele, o vidro que separava os bancos da frente e os bancos de trás era à prova de balas, logo, também a prova de flechas usadas como adagas.

O motorista entrava e tirava o boné que lhe incomodava mostrando certa calvície.

O motorista olhava assustado, enquanto o vigarista olhava curioso a reação da morena, esperando ela se acalmar, o que acontece depois de três longos minutos chutando o vidro.

- Agora que já se acalmou. Este é Luciano Barreto, o tirei de seu sono santificado para buscá-las. – Ele sorria cumprimentando. -Sei que fui um canalha, mas acredite, pelo que eu passei vocês teriam feito a mesma coisa. –Davis mostrava o braço com uma queimadura feia química na parte mais superficial da pele. –Querem a história ou preferem ir para casa?

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Matheus chegava em casa, tinha 1,89m de músculos bem torneados e dignos de um halterofilista. Com um cabelo curto e bem cortado como o de um verdadeiro militar. Tinha uma farda preta com coturno que cobria quase toda a canela, e com um colete à prova de bala pesado, aqueles usados em tropa de choque. Fechava as quatro trancas da porta, via no relógio que eram duas e meia da manhã.

Sua mulher e sua filha estavam dormindo trancadas no quarto. Preferia assim, ele mesmo reformava o apartamento sozinho, com vários livros do tipo “faça você mesmo”. Tanto que havia uma tomada para cada eletrodoméstico da casa. Ia direto para a cozinha, procurando algo para comer, e vendo que não havia nada além da comida dietética de sua mulher e do sacro-santos iogurtes de sua filha. Resolverá fazer o prato mais fácil que sabia: macarrão com queijo.

Começava a ferver a água enquanto via os temperos e condimentos, que era preciso para fazer seu conhecidíssimo macarrão. Matheus se orgulhava de manter os criminosos presos, era policial do Departamento de Operações Especiais de Andaluzia. O que incluía qualquer coisa que acontecesse que estivesse fora de controle da polícia comum. O que era bastante normal em Andaluzia, tanto que as estatísticas diziam que no mínimo havia uma perseguição de carros nas ruas, em um dia bom.

Ontem mesmo, ele havia estourado um cativeiro no qual era mantida refém a filha de um juiz por oito meliantes. Dois morreram no local, outros dois por ferimentos, os quatros restantes foram bastante espancados. Odiava isso, e isso porque ele não havia chegado para salvar os meliantes, não os culpava, mas eles eram humanos, mereciam ser tratados como um. Porém o pior foi há uma semana, na qual um assassino matou seis policiais e fugiu. Matheus até o alcançou, mas ele se esticava como os personagens de gibi que lia na infância, lembra de tê-lo atingindo com um tiro, mas ele tinha o sangue fluorescente e um cheio horrível.

Só de lembrar do cheiro, lhe causava ânsia. E deixava o macarrão cozinhar enquanto picava a cebola, tentava se concentrar na comida, apesar de comer bastante, nada supera uma comida caseira. Não conseguia relaxar a mente, nem mesmo cozinhando, no qual era seu hobby.

Terminando o tempero, ele refogava tudo na panela e desligava o macarrão já cozinhado. Quando seu celular toca do nada, olhava seu relógio na parede e era três da manhã. Só podia ser coisa séria, e atendia. Era a chefe do seu departamento já gritando mesmo antes do seu alô.

-Tenente, calma. Fale devagar e respire pausadamente. – Ouvia atentamente, mas ela apenas parava de gritar, a velocidade que eram de 7 palavras por segundo. Ele apenas tentava traduzir as palavras emendadas em alta velocidade. – O quê? Acidez? Ácido de dente retrô? Ah! Acidente no metrô! Onde? Amargo Frango? Almeida Franco! Com o quê?! Mirel Oito? Miguel Couto! Já to indo para aí!

Apagava o fogo com a comida semi-pronta, recuperava as chaves e o colete. Sua hora de descanso havia acabado. Destrancando a porta e a batia enquanto corria para o carro. Ao mesmo tempo em que a porta se trancava, saia do quarto cambaleante sua esposa, Alice. Loira de cabelos curtos vestida com robe. E via o famoso macarrão com queijo inacabado.

-Vamos terminar o serviço enquanto o homem de família é o herói da madrugada. –Colocava-se para terminar o prato do marido, para quando ele chegasse, poder comer.

*****

Depois de chegar com seu carro, uma S-10, encontrava já Vinny, o novato que achava que ele era uma lenda. Na verdade, Matheus era uma lenda em vários lugares, tanto no batalhão de operações especiais, quanto na prisão de segurança média Yolanda Macedo. Na qual, lhe rendeu o apelido de Cerberus, o cão negro de três cabeças que guarda as portas do inferno. Mesmo não sendo mais agente carcerário, o apelido ainda o seguia, os mais velhos que ele o tratavam-no como um mais veterano ainda, os novatos tratavam-no como um herói.

-Sargento! O senhor por aqui? Achei que estaria em casa! – Vinny era um recém-chegado, antigamente ele era um mero guarda de trânsito, mas ao contrário dos novatos Vinny fala demais, queria saber de mais. Ninguém queria ser o parceiro dele, Matheus tinha pena do moleque, mas chegava ao ponto de querer atirar a queima-roupa nele. – O senhor não vai acreditar, tem mais gente na perícia aqui do que quando o governador foi quase envenenado.

-Dá pra ser sucinto? Resumo do que aconteceu e onde está a nossa amada Tenente? – Matheus dizia apertando firmemente a parte macia do ombro de Vinny provocando uma dor alucinante que o fazia falar tudo rápido.

-Sabotagem metrô! Buraco de ácido! Sem vítimas! Duas testemunhas! Chefe lá em baixo! – Vinny apenas falava com os olhos fechados e com a dor alucinante do polegar do Cerberus invadindo seu corpo querendo perfurar sua pele.

-Obrigado! – Matheus largava o ombro dele e deixava-o cair no chão com a mão no ombro. – Não deixe ninguém entrar. – E entrava na estação do metrô onde tinha vários peritos.

Ao que parece a coisa era séria, a última coisa que lembra era dele e seu antigo parceiro no metrô e mais uns três caras resolvendo um sequestro no metrô. Foi o pior acidente que aquele metrô já tenha sentido, tanto que ele tinha ganhado um dente quebrado e uma cicatriz na altura das costelas, além de ter quebrado o nariz pela quinta vez.

Tinha dois caras sendo entrevistados, um técnico que não parecia dar muita informação e o outro tremia mais um pouco, de nervosismo, dando entrevista para um dos oficiais de campo. E na frente dos trilhos, olhando para tudo que parecesse uma evidência uma morena de roupas executivas, e com um distintivo enorme no pescoço, em um salto agulha. Com cabelos enormes, passando pela cintura. Matheus sabia que aquela silhueta escondia o policial mais durão do departamento, a Tenente Larissa Nolti.

A tenente tinha seus 29 anos, a tenente mais nova que já existiu no departamento, e ela era filha de Laura Nolti, ex-secretária de Segurança de Andaluzia. Que morreu durante um acidente de carro, Laura era conhecida como a “Dama de Ferro”, por sua conduta firme contra o crime e apoio aos policiais, Matheus era o único que tinha coragem de chamar Larissa de “A Donzela de Ferro”, coisa que ela odiava, porém Matheus era o melhor do departamento, dispensá-lo seria o mesmo que um agradecimento, então ela vivia dando-o mais trabalho.

-E então, Donzela? Por que me chamou, para varrer as sujeiras dos técnicos? – Matheus com um sorriso sincero na cara, já que da última vez, ele limpou os banheiros de todo o prédio.

- Para falar a verdade, não! Não ainda... –Larissa apesar de odiar o jeito sincero demais, talvez ele fosse o único e era bom confiar em alguém assim. Mesmo com seu jeito irritante. –Na verdade, aquele cretino anônimo que fez tudo isso, e quem melhor para conhecer aquele cretino. Qual é o nome dele agora? Celestino? Arquibaldo?

- E porque você acha que o Nathan fez isso?! – Não era o estilo de Nathan usar ácido e nem destruir propriedade do governo sem um bom motivo.

- Tenho uma descrição dele, e cinco balas de uma Glock 17, só falta mesmo conferir se bate com o registro dele. – Larissa não suportava Nathan, por diversos motivos, um deles por ele ser um fantasma nos registros, ele estava em todos e em nenhum. Usando documentos falsos, mas com histórias tão comuns, que as brechas no sistema, além dele não seguir regras e sem respeito nenhum por hierarquias. Só em pensar nele, ela já tinha um começo de frenesi de raiva. – Juro que vou trancafiá-lo junto com aquele monte de criminosos que ele ludibriou.

-Convenhamos, que pessoas que nem ele são tão comuns em Andaluzia, mesmo uma descrição física não seria uma surpresa encontrar. – dizia Matheus.

-Sei... E se eu souber que você o anda contratando para lhe ajudar com os casos como esse... Juro que vou lhe dar tanto serviço que você não verá sua filha até ela estar casada. – A tenente apontava o dedo na cara de seu sargento, não como uma ameaça, mas sim como uma promessa. Ela não era o tipo de mulher que fazia ameaças em vão. – Tanto que vou colocar você com um novo parceiro.

-Por favor, não me diga que é o Vinny, se não ele vai ser a primeira baixa que eu vou ter. – Matheus chegava a arrepiar. Ele era o maior linguarudo do batalhão e um ser irritante. E por mais que fosse paciência, toda ela tem limite.

-Não, ele vai ficar com o Soarez. Você vai treinar ela. – apontava para uma das pilastras do metrô.

Era diferente de tudo que ele viu na vida, uma mulher de curvas exuberantes e com traços orientais leves, e loira natural. Com os mesmo trajes de todos os outros oficiais, mas eles eram mais justos mostrando mais ainda suas curvas, mas sobrepujando seus próprios traços, havia uma Walther 97 e uma katana. Era o encontro de aparência e armas orientais e ocidentais.

-Ela é Hatori Khazarin, fiz um favor a um amigo da minha mãe e a coloquei no departamento. Na verdade, acho mais que ele fez um favor pra mim. A ficha dela é impressionante, ela tem tantas habilidades de combate quanto eu sei falar idiomas. – Larissa raramente elogiava alguém na frente da pessoa citada, é uma raridade mesmo. Matheus começava a pensar que a “Donzela de Ferro” não era por sua mãe, mas por sua baixa frequência de homens. – E ela é sua nova parceira, alguma objeção?

- Não... Claro que não... Só não quero que a sushi-bar aí, acabe que nem o Lucas! – Em missão de campo a tendência era solo. Tivera três parceiros apenas, Bruno que de tão nervoso atirou no pé e virou um alcoólatra, Lucas que hoje faz residência no Asilo Yolanda Espear, e o terceiro foi Nathan que foi o último que o acompanhava no mesmo ritmo, que hoje aprontava por aí, bancando o justiceiro.

-Não comente sobre o Lucas... – Larissa falava entre os dentes, enquanto a nipônica era impassível aos comentários dos dois, nem mesmo alterava a respiração. – Bem, agora ela é a sua parceira. E vai me reportar cada ação, e principalmente se você entrar em contato com aquele patife inútil. Agora vão fazer alguma coisa.

Larissa saia e bocejava por não conseguir seu sono completo e ainda porque teria um enorme dia de trabalho quando o sol raiasse. Pelo menos, estragou a noite daquele traidor do departamento. E deixava Matheus com a missão de deixar uma mulher que não era sua amada, Alice, o que lhe deixava bastante irritado. Principalmente quando o dia começava a raiar e ele não estava ao lado dela.

-Vamos ao trabalho, Japa-Girl. – Pegava o celular e ligava para Nathan para saber a sua versão da história, mas caia direto na caixa postal. E desligava frustrado, naquela hora ele poderia estar em qualquer parte de Andaluzia. Somente de dia que poderia encontrá-lo. – Vamos viajar pela cultura gastronômica noturno-urbana de Andaluzia. - Vamos, Robin!

A meio-nipônica olhava para o seu novo parceiro e arqueava a sobrancelha. Impulsionava o corpo contra a pilastra para começar a andar e sempre mantinha a mão esquerda na ponta do cabo de sua katana que estava do lado esquerdo do seu corpo. Vendo que teria um longo dia e que o trabalho não seria tão fácil.

******

O enorme policial e sua parceira estavam no camburão da polícia, e não na S-10 de Matheus. Conhecida como a 25-Beatrix, a maioria das coisas e pessoas que Matheus tinha ao lado sempre eram mulheres. E deixava o rádio ligado nas caixas de som, ouvindo as ordens dos expedidores. Dirigia para o único lugar aberto da cidade onde ele não era policial mesmo com farda, e com o melhor dono e a melhor bar-woman da cidade, que era Cnossos. Enquanto isso, a novata estava com a cabeça encostada no vidro olhando a paisagem de Andaluzia passar, com os seus desabrigados e fauna local, como cães vadios, gatos e ratos, passeando em seu ecossistema.

-E então, Gueixa. – Matheus começava a conversar com a sua nova parceira. – O que está achando de ser policial da zona de guerra brasileira? Onde a guerra civil já começou e nenhum peixe grande liga.

Khazarin ainda não falava, ainda olhava para fora observando as discrepâncias que eram os prédios de Andaluzia e os viventes da vida noturna, vendo a missão irônica de proteger os cidadãos que podem pagar por proteção dos cidadãos marginalizados que precisavam de proteção.

- Ora, ora. Veja você. Me deram uma parceira que não fala! Será que você tá cobrindo a cota de imigrantes e\ou deficientes? – Matheus tentava provocar para obter alguma resposta, mas nada. Apenas indiferença que era estranha em novatos. – Voto de silêncio? Cortou sua língua fazendo sushi?

Matheus para no sinal vermelho, em sua concepção ele não deveria apenas fazer cumprir a lei para os outros, mas ele mesmo deveria obedecer e respeitar. E mesmo assim continuava olhando para a solidão que Andaluzia trazia quando o sol se escondia, com apenas um olhar vazio.

O imenso policial desiste de fazê-la conversar e se reclina no banco do motorista esperando a eternidade de um sinal vermelho exposto. Matheus pensava que pelo menos era como estar sozinho, com uma boneca inflável do lado para evitar tanta solidão.

Khazarin estava cansada, Larissa lhe enchera de tanta informação que ela estava com dor de cabeça. Não queria ser o braço direito de ninguém, não queria ser os olhos de ninguém, queria ser apenas ela mesma; sem ser uma Hatori. Seria bom parar de ser uma Hatori, e decidia responder a conversa de seu parceiro.

Naquele momento tudo explodiu, a enorme mão de Matheus a pega pelos cabelos e bate com rapidez no painel do carro, causando um filete de sangue. Estava já com a mão na katana, mas não daria para usá-la no espaço daquele carro. E o vidro impactou, mas não estourou porque era aprova de bala. Ao se levantar, batia de novo no painel, com tranco que a viatura dava a ré. Ao ver com o olho esquerdo, o qual não tinha sangue passando por cima. Via um jipe, com armas saindo pelas janelas, e não sabia de onde havia surgido aquele veículo, mas Matheus parecia um veterano de guerra. Ele parecia sentir quando coisas estavam prestes a matá-lo.

-Benvinda a Andaluzia, novata! – Era assustador, pois Matheus estava com um sorriso enorme no rosto. Com o surto de adrenalina de um cavalo de corrida. Sorria como uma criança que iria comer o McLache Feliz. – Arruaceiros desgraçados, pensam que podem com policiais.

Matheus os via fazendo a volta, enquanto ele pisava fundo no acelerador sem esmorecer. Um dos marginais colocava o corpo para fora e atirava com uma AK-47. E com manobras em ziguezague, conseguia evitar 70% das balas, uma lata de alumínio nas mãos de um verdadeiro combatente era uma arma mortal, um fuzil na mão de um garoto era apenas uma faca de cozinha.

Já a sua passageira era jogada de um lado para outro freneticamente. O que não lhe deixava tempo para pensar, apenas para tentar não bater por toda cabine da viatura. Já Matheus era uma união com a viatura, com os braços firmes e presos no volante, com músculos enormes e tencionados, pupilas dilatadas e respiração ofegante. Os tiros ainda vinham pela frente, mas batiam apenas no pára-choque blindado.

- Por que eles estão atirando em nós? – Khazarin não conseguia falar direito e nem conseguia se estabilizar com as manobras arriscadas de seu novo parceiro.

- Então, a garota origami fala, péssima hora! – Puxava a Calibre 12 do banco traseiro ainda mantendo o ritmo de ziguezague quase dançante da viatura, e terminava de abrir a janela elétrica do lado do motorista. Colocava a arma para fora, e enquanto atirava e dirigia de marcha ré, em modo de manobra defensiva dignas de heróis de ação. Dividia seu tempo na ordem: dirigir, atirar e olhar para o retrovisor. – Eles são bandidos e nós policiais, eu no lugar deles faria o mesmo.

Mesmo pisando fundo, a velocidade na marcha ré não era superior ao do jipe que vinha de frente. Era assustador que mesmo com todos os fatores contra eles, Matheus continuava a dirigir velozmente, conseguia acertar o carro. Até que um dos atiradores colocava meio corpo para fora do veículo, para ter mais precisão para atirar. O que se mostrou um erro para o meliante e uma chance para Matheus.

Em uma fração de segundo, o policial do D.A.E. pisa fundo no freio e segura a porta de seu lado aberta, fazendo a sua carona ser prensada no banco pelo poder físico da inércia. O atirador vendo o que iria acontecer tenta entrar desesperadamente no carro novamente, enquanto o motorista tentava desviar, mas era tarde demais.

O atirador consegue colocar todo o corpo para dentro do carro, exceto o braço com a arma, no choque com a porta o braço é quebrado fazendo um ângulo de noventa graus na direção que não deveria fazer e fazia que a AK-47 voasse para longe e a porta novamente se fecha. E também fazia Khazarin bater novamente, mas dessa vez com as mãos sobre o painel, causando mais um hematoma em sua testa.

- Se segura aí, garota kung-fu. Que agora que fica divertido. – Khazarin olhava desesperada para o seu parceiro, olhando para ele perguntando-se, quantos hematomas teria que sofrer para ele acabar de se “divertir”, e observava-o girar o volante com uma mão só sem tirar os olhos dos retrovisores para não perdê-los de vista, como em um carro com direção hidráulica, mas aquilo era pura força sobre o volante.

Matheus desvira o carro para andar normalmente, enquanto eles saem em disparada fugindo. Os papéis de perseguidores e perseguidos estavam trocados agora. Com agora as duas mãos no volante, e com olhos no carro, parecia agora um olhar fixo e obstinado, e com um sorriso sádico no canto da boca.

- O que anda achando de Andaluzia até agora? – Matheus perguntava para sua nova parceira, sem ao menos olhar o quando ela estava ferida.

- Todos são loucos aqui! – Gritava para ser ouvida pelo barulho do motor. – Tem como você passar por eles?

- Não resisto ao pedido feminino. – Matheus pisava fundo novamente e mudava a marcha freneticamente fazendo novamente Khazarin ficar entre o banco, mas dessa vez mais controlada.

Khazarin pegava o cassetete básico de todo policial e deixava em suas pernas, enquanto retirava a katana da bainha, que emitia um som que ecoava pela viatura. O som quebrava qualquer um de tão agudo e musical que era. Uma lâmina reluzente e curva parecia que trazia algumas inscrições em japonês e quebrava o espectro de luz branco nas sete cores que a compõem.

A meio-nipônica abria a janela trincada do seu lado, e Matheus havia entendido apenas parte do plano sabia que ela queria o carro passando pelo lado dela. Talvez tivesse encontrado uma parceira que acompanhasse seu ritmo. O jipe passava do lado da viatura, a nova policial de Andaluzia colocava a katana do lado de fora, segurando a arma com a mesma vontade que Matheus segurava o volante.

A lâmina começava a cortar desde o pára-choque passando pelos pneus e saindo rapidamente, associando o fio da lâmina com a velocidade da viatura, inclusive sem eles mesmos perceberem faziam um talho limpo no pé do motorista do jipe. E ao ultrapassar, Khazarin trazia a katana para dentro novamente e lançava sobre os pneus destruídos, e o cassetete que travava algo debaixo do carro, que o fazia capotar três vezes violentamente.

Logo após a espadachim colocar sua arma na bainha, o carro freiava novamente de maneira abrupta. Fazendo Khazarin bater novamente no painel. Matheus puxava sua Calibre 12 e saia do carro, enquanto sua parceira se recuperava dos diversos acidentes que ela sofrera dentro da viatura.

-Se tiver alguém vivo, saia com as mãos para cima, se ainda tiver mãos. – Anunciava a voz de prisão de Matheus, para o carro destruído, esperando que ninguém atendesse, pois ele no mínimo teria um traumatismo craniano bem grave.

Khazarin saia logo em seguida, limpado o machucado na sobrancelha que não parava de sangrar. Que mantia seu olho esquerdo involuntariamente fechado, estava com a katana embainhada na cintura e com sua pistola Walther apontada, dando cobertura para seu parceiro.

-Você ta horrível, hein. – Diz Matheus olhando finalmente para a sua parceira.

Khazarin não se preocupava em responder ao seu parceiro que era mais perigoso com um carro do que com uma arma. Apenas prestava atenção do que poderia vir do carro, afinal, se o vidro do carro não fosse blindado, essa hora sua cabeça teria explodido. Logo, agora era pessoal.

-Bem, você é a novata, e você vai escrever todo relatório. Afinal, você está em estágio. – dizia Matheus já abaixando a arma ao ver um braço e um pé sem um corpo. Fatos que levam a presumir a morte dos meliantes, o que era um ledo engano.

Khazarin guardava a pistola e ia até a viatura chamar reforços, até que a mão sem o corpo voa em direção do pescoço de Cerberus, que larga a arma e tenta com as duas mãos tirar o estrangulamento. Tentava gritar mudo, mas saia um gemido grosso e desesperado. Tentava puxar, mas os dedos acabavam quase perfurando sua garganta.

Sua parceira ao quase entrar na viatura o vê sendo estrangulado pelo braço amputado, e novamente puxando a katana, vai ajudá-lo. Ao mesmo tempo em que o outro criminoso, o qual perdeu o pé, sai do carro e no lugar de seu pé havia uma estaca metálica brilhante e seus dedos mostravam a mesma coisa. Estacas extremamente afiadas saindo de seus dedos. E o mesmo ia em direção da nipônica.

A membro da família Hatori se impressionava com aquilo, afinal de contas nunca vira aquilo na vida. Acordou enquanto a mão dele com dedos de estacas desciam em direção de seu rosto. Que com um movimento preciso e meticuloso de dar um passo para trás e inclinar o corpo para trás desviava com eficiência, quase como uma dança.

Ao recuperar sua base de apoio, deixava as pernas firmes novamente e colocava as duas mãos no cabo de sua espada. Enquanto via a outra mão vir em sua direção, usava a lâmina como escudo, para caso a garra daquele sujeito a atacasse, mas não mirava nas lâminas, mas sim no pulso. Aproveitando a sua própria força, a lâmina da katana e a força de seu oponente contra ele mesmo. A mão com lâminas encravava no chão um pouco atrás da espadachim do D.A.E., e na mesma posição, começava um movimento que vinha de seus quadris e repercutia na lâmina curva, fazendo um enorme arco para baixo que cortava as pernas do oponente.

Uma das pernas que era uma estaca fincava no chão, mas a outra caia para frente enquanto o corpo caia para trás. E em um movimento bastante natural para ela. Ficava com a espada apenas na mão esquerda e a virava circularmente mudando a posição da lâmina em um ângulo de 180º e pulava para cima de seu oponente ainda em queda. Encravando a katana no coração de seu agressor precisamente, usando a mão direita, o peso do corpo e a gravidade para conseguir penetração. O movimento foi tão intenso que seu cabelo preso se soltava, e lhe cobria todo rosto. A única coisa que Khazarin via era a sua espada fincada cirurgicamente no coração do homem recém-morto, passando sem ao menos encostar nos ossos da caixa torácica.

Matheus estava à beira de um sufocamento ou de seu pescoço ser quebrado ao meio. Até que via um brilho esverdeado vindo de dentro do carro, e tentando ignorar a perda de consciência via que era o homem preso nas ferragens ainda controlando o braço perdido.

Via que a arma estava sobre seus pés, sabia que se ajoelhasse para pegar a arma sua atenção seria dividia entre deter a mão e pegar a Calibre 12. Até que pisava na arma de uma maneira que ela subia verticalmente em pé e largava uma das mãos que segurava a mão estranguladora para pegar a arma. Com a arma já destravada, atirava e com o “coice” da arma ele perdia o equilíbrio e ia para trás.

Matheus não atirava no controlador, mas sim no tanque de gasolina do carro que causava uma enorme explosão que o jogava mais para trás ainda sem o equilíbrio necessário para se manter em pé. A mão parava de estrangular e ele a jogava para longe. Ela explodia em um pus verde-escuro doentio, do mesmo jeito que o oponente de Khazarin e suas partes espalhadas pela rua derretiam na mesma cor e cheiro.

Ambos ofegantes olhavam um para o outro. Matheus levantava o dedo polegar com vontade dizendo que estava bem, e ao mesmo tempo esperando a resposta do estado de Khazarin. Que sorria levemente de canto da boca e tirava os longos cabelos loiros da frente do rosto. E acenava da mesma maneira, e deixava-se cair sentada no meio-fio da calçada distante o suficiente da gosma que havia se formado.

Até que mais viaturas chegam e os vizinhos tomam coragem para sair dos quartos mais seguros de suas casas para ver o que havia acontecido.

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