20.3.10

Capítulo 2 - Num Labirinto

“Andaluzia foi fundada essencialmente por exploradores dos países ibéricos: Portugal e Espanha, mas não pela nobreza, mas sim por criminosos, nobres caídos, exilados, escravos, dentre outros... Tirando os nativos de espírito puro que foram usados pelos recém-chegados, de invasores de todas as outras nacionalidades... E como em todo o lugar na história do mundo: ‘a tragédia continua a mesma, só os atores mudam’ e Andaluzia é um ótimo exemplo disso...”

-Demétrius Niotis, professor universitário de Sociologia.


O táxi chegava a um enorme prédio, mas o primeiro andar dele era quase como uma casa de show, com uma fila enorme do lado de fora. Havia detalhes da cultura helênica no estabelecimento, com as colunas que todos já viram em livros de História. Inscrições em grego antigo e pinturas registrando lendas e histórias conhecidas ou nem tanto assim.

O motorista do táxi saia rápido para descarregar as malas que estavam na traseira do carro, enquanto Davis abria as portas traseiras para Fernanda e Cristiane saírem. Que lhe olhavam com reprovação, mas que só aceitaram vir para saber o que aconteceu no metrô.

-Amiga! Aqui é o Cnossos! Aquela boate seletiva que o dono fez só para os conhecidos dele, nem mesmo alguns figurões da elite de Andaluzia chegaram a entrar. – Os olhos de Fernanda não acreditavam naquela visão e nem ao menos que Davis, ou seja, lá qual for o nome dele, tivesse autorização de entrar ali.

- É! Notasse pelo tamanho dos seguranças! – Cristiane notava que o menor dos seguranças tinha no mínimo 1,80m, e todos parecidos com capangas de filme B. Pontos de escuta no ouvido, e mãos que abrigariam dois copos de vidro se esticadas.

Fernanda estava de boca aberta, se conseguisse fotos, de estagiária do Pauta Livre News passaria a colunista fixa, até mesmo com uma sala própria. Enquanto Cristiane olhava para todos os lados se sentindo meio deslocada por estar com um jaleco da universidade e todas as outras com vestidos de decotes e aberturas estrategicamente sensuais.

Davis conversava com Luciano, o motorista calvo, apertava sua mão e sentia uma fisgada no braço. Devido à queimadura química. Pegava as malas das meninas e se despedia como bons amigos.

A morena deixava a amiga em suas divagações e ambições profissionais e ia em direção do homem que as enganara tantas vezes, ao mesmo tempo em que o táxi partia. Pegava as suas bolsas e as de Fernanda, com rispidez.

-Não se preocupe, não tenho mais nada de interessante para olhar para dentro das suas bolsas. – Davis dizia puxando as bolsas para si mesmo.

-Perdoe-me se não confio em você, mas prefiro assim. – Cristiane tratava com rispidez e mentia, não era porque desconfiava que pudesse levar as suas malas, mas sim pelo braço que começava a sangrar com força por causa do ferimento, a cada vez que ele fazia mais esforço o braço sangrava mais, era possível segui-lo pelo rastro rubro que ele deixava gotejar. O qual ele mesmo não percebeu.

- Você que sabe... – Cada vez a morena ganhava mais a afeição de Davis, mas ele era péssimo para tratar pessoas de diferentes maneiras, ou mesmo expor algo que ele o considerasse vulnerável.

-Nanda! – Cristiane chamava a amiga que já colocava as mãos na forma de um retângulo deslumbrando através dele os ângulos de possíveis fotos que os outros jornais não teriam pegado. – Nanda! – Falava bem mais alto para que a amiga ouvisse, mas ela ainda estava perdida em suas miragens fotográficas.

Até que Davis pega Fernanda pelo ombro passando o braço pelas suas costas e a virava na direção da amiga, e logo em seguida abaixava a “câmera imaginária” na direção de Cristiane. Finalmente ela via a amiga carregando as bolsas pesadas e corria para ajudar à amiga. Enquanto Davis ia em direção da porta e era bloqueado por um dos seguranças que não tinha pescoço.

-Ninguém passa sem a autorização ou convite. – A voz do segurança era pesada e agressiva. Davis olhava para o grandalhão vendo que ele era um dos novos contratados. O grande problema de Cnossos é que os seguranças eram trocados frequentemente por causa dos acidentes no trabalho.

-To vendo que você foi contratado essa semana, você no lugar da Susy?! – Quando a palavra Susy é citada, os seguranças da fila se tremeram e correram imediatamente para deter o novato.

-Você tá maluco?! – Perguntava o segurança de cavanhaque e careca. – Esse cara, derrubou o Deus!

-Pode entrar senhor, o Princeps não está, mas ele chega mais tarde. – dizia o segundo segurança que se colocava entre Davis e o novato sem pescoço.

-Tudo bem, eu vou esperar lá dentro. Alguma objeção?! – Davis ultrapassava o olhar com jeito de boxeador para o sem pescoço.

-Uau! – Cristiane soltava a interjeição. Vendo que Davis encarava seguranças sem demonstrar medo, apenas os tratando do jeito que eles eram realmente, pessoas comuns. – Impressionante como ele tem controle da situação, não é?! Nanda?!

Cristiane ao olhar para a amiga, a via preparando a câmera de 35 mm colocando filme na máquina, ignorando a amiga solenemente.

-Acho melhor você não fazer isso. –dizia a morena cutucando a amiga. – Seguranças enormes não gostam de ser fotografados e tendem a quebrar equipamentos.

-Pois é, né... – Com uma cara de decepção Fernanda guardava o equipamento. E seguiam Davis, até serem barradas pelos mesmos seguranças com cara de querer surrar os próximos que tentassem entrar com a demonstração de falta de autoridade com Davis.

-Elas estão comigo. – Dizia Davis esperando na porta. – Algum problema, cavalheiros?

-Nenhum, senhor! – Dizia o segurança do cavanhaque.

Os seguranças olhavam para aquelas jovens mal-vestidas para Cnossos e ouviam as reclamações dos que permaneciam na fila. E voltavam aos seus afazeres, enquanto orgulhosamente elas entravam na boate mais badalada do local.

Ao entrar viam um enorme salão, algumas jovens elitistas dançando com membros de alguma gangue latina, grande parte tinham tatuagens e bigodes. E as jovens, grande parte ainda na adolescência filhas de empresários que se apaixonam pelo mundo do crime. Tocava alguma remixagem do David Guetta que embreava os ouvidos e os corpos dos freqüentadores do andar térreo.

O som era alto demais, fazia vibrar o estômago e a garganta. Havia uma fumaça no chão, dando a impressão que todos flutuavam na pista de dança. As luzes presas no teto alternavam de cor e tinham um movimento próprio e inteligente, focando os melhores dançarinos ou mesmo os sem companhia. As paredes eram forradas com a mesma lona das cortinas dos teatros e casas de show importantes.

Imediatamente vinham as recepcionistas, todas extremamente lindas e vestidas como secretárias de firmas multinacionais. Que colocavam pulseiras neles. Em Davis a pulseira era dourada, enquanto das meninas eram lilases, somente elas eram revistadas pelas recepcionistas. A que revistaria Davis ao invés disso, jogava seu charme para ele.

-Uia! Gostei daqui de baixo. Bem, dançante, não é?! Nanda?! – dizia Cristiane.

- Pois é! –diz Fernanda embalada pelo ritmo.

-Se quiser podem ficar, mas nem eu gostaria de me envolver com Los Chicanos. Eles meio que são brutais com mulheres. – O que era verdade, a última notícia que ele tivera dessa gangue era que haviam retalhado o rosto de uma jovem que negara um beijo.

- É, péssima idéia amiga! – dizia Fernanda a Cristiane.

- E pra onde nós vamos? – indagava Cristiane.

-Para uma área mais reservada, até porque esse barulho me dá dor de cabeça. – Davis odiava música muito alta, mas gostava de Cnossos pelo ambiente de paz que havia, e até mesmo pelo dono que era um amigo seu.

Ao chegarem à porta da escada da sala VIP, havia mais um segurança, esse com cabelo rastafári e com músculos inchados mesmo sob o terno caro, mas seu braço esquerdo estava engessado, mas ainda assim amedrontador.

O homem ao olhar o vigarista, começa a suar, lembrando o motivo dele estar com braço quebrado, e abria a porta imediatamente, meio a contragosto e meio com medo do que lê e deveria aprontar no estabelecimento e que não sobrasse para ele. As duas sentiam nos ossos o momento de tensão entre dos dois e aproveitavam, empurravam Davis para dentro da porta.

-Afinal, o que você fez para tanto segurança ter medo de você? – indagava Cristiane.

-Digamos que eu sou um sem paciência e eles viram o que atropelou ele. – Davis dizia como uma boa memória. – Mas acho melhor eu não contar, já que a história que vocês querem saber é outra. Primeiro vamos sentar.

Ao abrir a segunda porta de isolamento acústico e de ambiente. A música mudava completamente, tocava “Sesión de medianoche” do Tanghetto levemente no andar, como se a batida guiasse-os para o andar, mostrando a diferença entre os ambientes. A opressão de seguranças de um e a liberdade que o outro oferecia.

Viam que o andar era como um restaurante onde todas as garçonetes, pareciam mais frequentadoras. Havia também muitas acompanhantes que realmente mereciam o termo, pois elas eram refinadas, roupas caras e se passariam realmente por damas da sociedade, mas mesmo naquele ambiente de glamour, o homem de terno rasgado, a fotógrafa e a estudante universitária eram olhados com desprezo pelos outros freqüentadores.

-Quem deixou a ralé entrar? – dizia alguma voz dos becos escuros que eram os bancos quase como salas.

-Os melhores ambientes são os mais hostis. – dizia Fernanda como citação de algum conhecido filósofo.

-Eu nem percebo mais, isso sempre acontece comigo. – Davis ria levemente. – Sentem-se aqui que eu vou falar com a bartender. Ela é durona, porém sempre me ajuda com as coisas aqui.

Davis deixava-as sozinhas enquanto ia falar com a balconista, e deixava a mala em cima da mesa onde elas deveriam sentar.

-Uau! Esse cara é bom. Consegue dar porrada em caras gigantescos, sabe se virar em situações de risco, raciocínio rápido, tem como acordar alguém às três da manhã, cobrar favores e no final, é gente boa! – Fernanda dizia sentando no banco colado da parede no qual sentiasse afundando. – E isso é melhor que minha cama.

Mas era a vez de Cristiane ignorar os comentários da amiga, via que Davis mancava, além do braço que era carne viva. No lugar dele, ela estaria reclamando demasiadamente. Era quase como se ele quisesse suportar tudo sozinho, ou mesmo não tivesse ninguém que o ajudasse. Ainda sim, parecia que ele fazia esse serviço bem.

-Cris?! Acorda, mulé! – dizia Fernanda chamando a atenção da amiga. – Você tá gostando mesmo desse sujeito?

-Eu?! Só estou preocupada, não viu o braço dele? Sou uma Bióloga, tenho amor à vida, por qualquer uma. – dizia Cristiane.

-Sei, vou fingir que acredito, tá?! – Dizia Fernanda, olhando para todo lugar. – Ora, ora. Se não é a secretária do editor chefe, quando eu dizia que ela era de outro ramo, era verdade.

- Onde?
 *****

Chegando ao balcão, Davis escondia o braço machucado da barwoman. E ainda tentava disfarçar o dedo deslocado que doía a cada passo. Sentava com o braço esquerdo abaixado, e apoiava o direito no balcão dando-o mais cobertura.

- Como está à noite, Ariadne? – dizia para a balconista de costas, fazendo alguma bebida para um dos frequentadores.

- Bem na medida do possível, Senhor Anônimo! – Ariadne era filha de Princeps, e desde os dez anos fazia bebidas, apesar de não gostar delas; mas adorava vê-las e fazê-las. Era como ser um doceiro com diabetes, o melhor empregado que não daria prejuízo.

Ariadne tinha uma pele muito branca, de olhos azuis e cabelos de castanhos soltos e bem arrumados. E desde que ele agrediu o segurança e logo em seguida sentou pedindo sua bebida sem ao menos olhar seu decote, se sentia muito mais segura com Davis por perto.

- E a sua? Como está indo? To vendo que boa! – Ariadne mesmo estando de costas tinha os olhos em tudo, pois atrás do balcão havia a teve com as câmeras de segurança, e falava das duas mulheres que ele havia trazido.

- Nada, está bastante tediosa até, achei elas perdidas na noite de Andaluzia e resolvi ajudá-las. – Era uma resposta educada para ela, afinal não iria falar que um cara com poder de derreter as coisas foi morto por ele e derreteu também os trilhos do metrô, no qual quase virou e elas estavam dentro. – Me traz o de sempre, um refrigerante e um suco de maracujá? Consegue?

- Seria mais fácil se você me pedisse heroína banhada com Trypanol, mas eu consigo para você sim. Só cuida do balcão pra mim! – Ele acenava com a mão enquanto deixava a cabeça cair em cima do balcão. Ariadne se virava e ia em direção da cozinha, onde outros funcionários trabalhavam.

E quase ao mesmo tempo uma das várias acompanhantes que estavam ali, senta ao dele no balcão. O país era livre, apesar dele mesmo não gostar de companhias e gente muito próxima a ele. Gostava de companhia, mas de pessoas de sua confiança, de preferência que fosse a Cristiane.

-Oi, gato! Tudo bem? –A voz era meio estridente, que chegava a doer os ouvidos, se perguntava se era o dia de tudo dar errado e ainda aparecer à frase: “Oi, gato! Tudo bem?”. Se soubesse, teria ficado em casa.

Ainda sim, com a cabeça baixa ele indicava com o polegar que estava tudo bem, e com a mesma mão mandava-a embora, sem ao menos dizer uma única palavra. Esperava que com isso conseguisse ficar parado com a cabeça abaixada, ignorando aquele cheiro de fumaça de cigarro que permeava o ar.

-Qual é gato?! Tenho a solução pra essa cabeça baixa e ainda faço metade do preço do que suas amigas na mesa fazem e ainda chamo as minhas amigas se você gostar de “em grupo”. –Provavelmente ou ela gostava de gente feia ou não conseguia juntar o dinheiro para seu cafetão. –Posso fazer essas cabeças levantarem.

-Acho melhor você procurar outro, com mais dinheiro e mais paciência pra você. Só vim aqui para conversar e estou sem dinheiro algum. –Era tudo mentira, estava apenas com muitas idéias serpenteando muito rápido pela sua cabeça e tinha 30 mil na maleta, mas em parte, educação se trata de mentir grande parte das vezes.

-Se fazendo de difícil é?! Que foi? Não sou seu tipo? –A acompanhante deslizava a mão pela nuca amostra lê provocando arrepios, porém tenso do jeito que estava quase puxando a Glock para cima de qualquer um, Davis tirava a mão dela de sua nuca.

-Digamos apenas que eu não sou o tipo de ninguém...

-Você é gay?! –A pergunta que não quer calar, nesse ponto já havia outras acompanhantes observando o diálogo, enquanto seus acompanhados deslizavam a mão pelos seus corpos. Fernanda e Cristiane ainda estavam distraídas sussurrando baixo.

-Não, ele apenas não quer pegar AIDS. –Ariadne voltava com um imenso copo fumegante na mão colocando na frente do homem. –O que eu já disse sobre incomodar as pessoas no balcão. Vou ter que chamar Deus?!

A acompanhante saia frustrada, todas se aproveitavam do balcão para tirar o parvo dinheiro de um pobre coitado sem auto-estima, era fácil levá-los. Mas não de Davis, então ela voltava para um banco à procura de um próximo cliente.

-Obrigado, mas ainda chama Susy de Deus? –Deus era o apelido que ele tinha devido ao seu tamanho descomunal e pela sua atenção aos fatos, e Susy foi o apelido que Davis lhe deu, depois de deixá-lo inconsciente.

-Digamos que Susy não é um bom nome para um segurança do tamanho dele. –Ria Ariadne, enquanto Davis tomava sua bebida, olhava fixamente ele do jeito que sorvia, em cada detalhe que movimentava os olhos em combinação com a mão. –Agora melhor você voltar, antes que um desses velhos gordos pense que suas amigas são iguais a essas meretrizes.

-Obrigado, Ariadne! – Saia com os três copos e voltava para a mesa. Equilibrando e ainda tentando disfarçar a manquidão.

Cristiane lhe ajudava com os copos, e via que havia suco de maracujá para ela. O qual é uma das poucas coisas que ela bebe.

-Como você sabia? – indagava Cristiane.

 - Um enrolador não revela seus segredos assim! – Davis se sentava, e dava logo um enorme gole em seu café fumegante.

- Você não tinha tomado um copo enorme de café no táxi? – perguntava Fernanda.

- Não se toma café o suficiente. – Respondia Davis novamente dando mais um gole longo em seu café.

-Tomar tanto café assim, faz mal! – dizia Cristiane. – E por que vir para um lugar desses para tomar café? Por que não em uma padaria ou coisa assim?

- Pra mim, faz mal não tomar tanto café assim! – Tomando outro gole que parecia que aquele café fumegante era água!

 -Se eu tomar em padaria vou ter que dividir um espaço apertado com um monte de gente, além das moscas. Aqui as pessoas não querem ser reconhecidas e não tem moscas, na minha concepção é um ótimo lugar para se tomar um café. – Sorria e finalmente largava o enorme copo de café na mesa e respirava fundo. – Entendeu?

- O que eu entendi é que você é bem doido. Isso que é verdade. – Cristiane ainda estava bem preocupada com o braço dele que poderia pegar uma infecção. – Pode chamar a garçonete?

- Claro! – Levantava o braço bom para chamar uma das atendentes que ficavam em pontos cegos para que não incomodassem os frequentadores, mas estavam atentas a qualquer chamado. E como pura mágica uma delas aparecia silenciosa. Ao se apresentar assustava Fernanda que se entretia com os bancos acolchoados.

- Pode me trazer um kit primeiros socorros? – Cristiane pedia com educação à mulher que logo se retirava.

- Por quê? Vocês estão machucadas? – Davis muda a cara com medo que uma delas estivesse ferida.

-Estamos bem, você que não está! – A Srta. Andallas olhava sério e reprovador para o vigarista. Agora me dá o seu pé?

-Ih... Aquele olhar. – dizia Fernanda.

-Como assim “me dá o pé”? Assim, sem jantar e nem flores? – Davis tentava brincar com a situação, uma das suas válvulas de escape, porque tinha medo de perder o dedo nessa brincadeira. Então dava o pé o qual ele não mancava.

-É o outro! – Davis olha para a cara dela, e vendo aquele olhar sério e determinado, dava o pé certo. O qual ela tirava a meia e via que havia um dedo roxo e deslocado. – Isso vai doer um pouco, mas é melhor agora do que ter que amputar alguma coisa.

Davis acena que sim, Fernanda cobre os olhos e Cristiane pega no dedo deslocado preparando para puxar o dedo deslocado de seu paciente. A dor que vem em seguida é alucinante, fazendo Davis trincar os dentes e lacrimejar. A fotógrafa teve um espasmo de dor alheia, imaginando o que o vigarista estava sentindo. A arqueira já era mais controlada, fazia isso com animais feridos em seu estágio no zoológico no qual queria trabalhar.

Quando realoca finalmente o dedo e larga o pé do paciente, aparece a garçonete com uma mala digna de um lar até mesmo com um kit cirúrgico básico, e logo em seguia se retira. O que em Cnossos era natural, pois chegavam clientes baleados o qual o médico residente estava disponível, mas apenas com conivência do Princeps.

-Vamos tratar esse braço. Enquanto isso, conte-nos a história. – Cristiane abria a maleta puxando o que queria e ia deixando sobre a mesa. Sua amiga deixava uma abertura pequena o suficiente para olhar o ferimento, e ao ver cobria os olhos novamente.

-Bem, eu havia entrado no mesmo metrô que vocês, até que um palhaço me pediu fogo, e eu atirei nele... – Gritava com a ardência do ferimento que estava sendo limpo e ameaçava a tirar a mão, até que foi puxada novamente com força pela curandeira Andallas.

- Peraí! - dizia Fernanda ainda com os olhos tampados. – Você atirou no cara, por que ele te pediu fogo?

- Pois é! Primeiro é que da noite em Andaluzia, não há ninguém que preste. A segunda é que ele estava no meu vagão o qual estava vazio quando eu entrei. E eu não confio em ninguém de noite. – Davis dava outro grito.

- Até que faz sentido, pena que não seguimos essa linha de raciocínio. – Era mais um comentário ferino de Cristiane ao lembrar que o mesmo que contava a história havia revirado sua bolsa.

- Concordo, mas deixe-me acabar de contar. Eu atirei, mas com munição não-letal e no ombro dele, balas de borracha para ser mais preciso, mas ele agarrou o braço o qual nossa pseudo-médica cuida nesse momento. Só senti calor e a fumaça subindo da manga do Blazer e da camisa depois, o chutei para longe e passei por cima dele. E juro por esse café, que ele iria cuspir uma rajada de ácido em mim. E corri, o máximo que pude, sabia que ele iria me seguir e apenas fechava as portas, não as trancava. Até que em vez de continuar, eu parei e subi em um banco, já que ele havia me perdido de vista. Atirei no pescoço dele, mas não esperava que o matasse. E quando eu vi a pele dele virar ácido, corri para o primeiro vagão sabendo o que iria acontecer. – Olhava apara a cara de ambas, boquiabertas. – O resto da história vocês já sabem...

- Contando ninguém acredita. – Fala Cristiane olhando seriamente para cara de Davis.

- Não sou o especialista aqui, mas diga que não é uma queimadura química forte de baixa exposição que sofri. – Cristiane acenava com a cabeça que sim, era quase como ácido sulfúrico tivesse caído em sua pele, e limpado os ferimentos, parecia um formato de uma mão segurando seu antebraço.

- Pode repetir tudo? – Fernanda apontava seu MP4 para Davis como uma arma, pensando que tinha conseguido a matéria do ano.

-Se continuar apontando essa coisa pra mim, você vai engolir isso. – Olhava diretamente para os olhos de Fernanda que se retraia e com cara de decepção. – Mas voltando o assunto, sem gravação... Isso não é a primeira vez, persegui um cara que se esticava como um herói de quadrinhos, um companheiro deu um tiro nele, e saiu um sangue podre verde. Só em pensar já sinto vontade de vomitar.

- Eu hein... – dizia Cristiane dando um nó no esparadrapo. – E onde entra a explicação de você nos ajudar e revirar nossas bolsas?

- No começo só quis ajudá-las, está mais que evidente que vocês não são os “rastejantes da noite de Andaluzia”, quis com todo altruísmo protegê-las, mas depois de encarar um cara que corroe coisas e quase levar uma flechada. Você começa a ficar paranóico, tinha que saber quem eram vocês. – explicava Davis. – Qualquer um, teria levado um tiro na rótula como aviso, na melhor das hipóteses.

As amigas engolem a seco aquela informação, pois não houve riso sarcástico e nem hesitação. Sabiam que ele atiraria na rótula delas, caso tivesse a mínima dúvida que elas fossem “perigosas”.

Cortando o clima abruptamente, uma figura no mínimo exótica aparece no andar VIP, com enormes óculos brega, chapéu de boiadeiro, uma fivela enorme com o nome de um rancho, camisa social, jaqueta de couro e botas com esporas de metal. Que contrastavam com sua barba branca e um rabo de cavalo, ambas grisalhas, e o rosto cheio de rugas com um corpo nada esportivo.

Todos nas mesas ou o cumprimentavam ou se escondiam atrás de suas respectivas acompanhantes. Fernanda e Cris olhavam boquiabertas para tal figura exótica. Andava com a mão na fivela e com as pernas arqueadas, que lhe davam um ar de faroeste.

Ao ver Davis colocando o sapato, abria os braços como um pai que recebe um filho da escola.

- Ora, ora. Se não é o “Homem sem Nome”, o “Senhor Anônimo”, o “Icógnico”, do que devo chamar um dos meus melhores pupilos? Fale que é Thalles, acho que Thalles combina com você. – Sua voz era grave e carregada de “malandragem”, com uma rouquidão que lhe dava um ar de sedutor.

- Infelizmente, não. Hoje é Davis. - Ao acabar de colocar o sapato, ia de encontro com o Cowboy de Andaluzia para o abraço. – Mas peraí, da última vez que vim você era um Surfista Havaiano!

-Agora sou um Hell Angel. E em comemoração ao seu novo nome, eu comprei uma Harley Davidson. Só não deixo você andar, por causa dessa cabeça quente que você tem. – Olhava para mesa e via as duas jovens e voltava à atenção para o seu discípulo. – Esse é meu garoto, veio me mostrar o que conseguiu ou me oferecer?

Ambas ficam chocadas com o comentário, mas iriam esperar a resposta de Davis para reagir.

- Não, são simplesmente amigas. Como a Ariadne! Mas não, realmente não é esse o motivo da minha vinda, queria saber o que você anda ouvindo ou vendo de estranho em Andaluzia. - dizia o Senhor Anônimo com hesitação.

- À noite, Andaluzia é a mulher mais caprichosa e cheia de vontades, como toda mulher caprichosa e cheia de vontades, o que as tornam, tanto Andaluzia quanto as mulheres, estranhas por natureza. Então fale o nível de estranheza. – dizia o dono do estabelecimento.

O vigarista tirava a bandagem do braço, Cris esboçava um pedido para que não o fizesse, mas era tarde demais. Ele tirava e mostrava a queimadura química com a marca de uma mão. Princeps olhava com atenção o ferimento, e constatava que era uma queimadura química.

- Foi um torcedor dos Rubros, pelo menos parecia um deles. Ele tinha também sangue ácido e os olhos pulsavam verde-nuclear. Infelizmente ele morreu. – Davis tentava colocar novamente o curativo do braço, até que Cris vendo que ele não fazia aquilo muito bem, tomava a tarefa para si novamente. Enfaixando o braço.

- Pessoalmente só ouço que detritos de alguma empresa andam espalhados pela cidade inteira, e que nenhuma fábrica é de Andaluzia. E tal coisa é da cor verde-nuclear, foi a única coisa que eu ouvi falar, mas vou pesquisar sobre o assunto para você. – O dono do estabelecimento atuava como pai de Davis.

- Obrigado, Demétrius! E o seu dinheiro vai ser depositado na conta de sempre, certo?!

- Exato, jovem. Adoro crianças inteligentes. – Batia na testa de Davis levemente. – Bom, garoto! Agora, vá cavaleiro!

Ariadne chegava com uma bandeja descartável com quatro copos enormes de café e imediatamente entregava para o surpreso Davis, o qual tratava de enfiar a mão no bolso, até que foi detido por Demétrius.

- Não precisa pagar por isso, não será isso que vai me falir. – Demétrius abraçava a filha pela cintura, como uma foto de família clássica.

- E aproveite e leve-as para casa em segurança. – disse Ariadne para o seu único cliente que tomava o seu café, referindo-se as meninas que ele trouxe. – Não quero que elas se tornem essas perdidas que eu vigio.

Davis acenava afirmativamente e saia do recinto com seu café e sua mala, as duas amigas acenavam para o Princeps e sua filha e saiam logo em seguida.

Desciam as escadas para o piso inferior e ao abrirem a porta encontravam o segurança do braço quebrado. Davis e o Leão-de-Chácara cruzam olhares parados. Até que o vigarista oferece um dos copos de café para o homem do braço quebrado.

- A noite pode ser longa, Susy! Melhor um café pra mantê-lo acordado. – Deus aceita a contragosto e com um sorriso de Davis.

O trio saia com mais dignidade do que entrou, sobre os olhos de inveja dos membros na fila que iam em vão em busca de uma chance de entrar em Cnossos. As jovens saiam com um novo status e ganhavam flashes de algumas máquinas de alguns paparazzi que espreitavam o local. Enquanto Davis escondia o rosto, equilibrando o café na frente do rosto. Fernanda acha que reconhecia um dos paparazzi, mas antes de se acostumar com o flash das fotos, era arrastada por Cris que a puxava pelo braço e ao mesmo tempo cobria seu rosto.

Chegando ao sombrio estacionamento, diversos carros variando entre Brasílias em ponto de se desmanchar em ferrugem e com a clássica argamassa cinza cobrindo uma chapa do carro inteira, e ao lado Audis, BMWs e Vectras. Sempre tendo um poste com uma luz forte iluminando todos os carros, porém deixando dois metros em volta no mais profundo breu. Ocultando talvez, um sequestrador, estuprador ou um morador de rua buscando um lugar bom para dormir.

- Agora só falta descobrir qual é a BMW de Carlos Almeida! – dizia Davis colocando a maleta e o café em cima de um Santana que estava ao seu lado.

- Como assim, você rouba um carro e não sabe qual é ele? – A ruiva indagava ao vigarista.

- Simples, pra mim carros são carros. Veículos que servem para ir do ponto A ao ponto B, e de vez em quando ao ponto C. Carregando cinco passageiros confortavelmente. – Ainda sentido um pouco de dor no braço, ele abre a maleta. – Não para outros que carros são órgãos sexuais, ou como outras que acham que isso a levam ao ponto G. Então por que me prender a marcas de carros sabendo que tem mais coisa para eu saber e prestar atenção?

- Adorei o discurso, mas como você pretende achá-lo? – Olhava a morena para seu paciente.

- Podemos achar as características do carro pelo que o documento diz, podemos achar até pela placa. – dizia a fotógrafa já pegando os documentos do carro. Ao mesmo tempo em que o homem de blazer apertava o chaveiro do carro, fazendo o carro emitir um barulho eletrônico e piscar todos os faróis. – Ou podemos fazer isso!

Todos sorriam e iam em direção do carro, até que três sombras aparecem de três carros.

Eram três torcedores dos Rubros, só que ao contrário do que havia ocorrido no metrô, cada um deles trazia uma arma. Barra de ferro, correntes e um facão. Eram enormes assim como o outro, poucas diferenças entres eles, mais banho, menos cabelos, colunas tortas, narizes quebrados, porém o fato que mais chamava atenção eram os olhos verde-nuclear deles.

- Foi você que pegou o nosso companheiro no metrô! Agora nós pega você. – dizia o do facão que parecia ser o líder daquela trupe.

- Deixa vê se eu entendi, o D’Artanhan foi morto e o Athos, Porthos e Aramis vieram vingar o pseudo-escoteiro do rei? Muito bem, primeiro não acham que verde nuclear é meio cheguei? Segundo, por que não trouxeram revolveres ou espingardas do que correntes, facas e bastões? E terceiro, tenho três cafés esfriando, e eu preciso levar essas moças, então que tal eu dar essas chaves de uma BMW e 30 mil reais e vocês me deixam em paz?

- E que tal matarmos você, levar o dinheiro, o carro e as mulheres? – dizia o da barra de ferro.

As garotas suam frio desse comentário, e apenas olham para Davis sem saber o que fazer e o que ele iria fazer diante de três enormes homens. Elas mesmas pensam que no lugar dele, apenas sairiam fugindo, deixando tudo para trás.

- É né, depois me recrimina por eu atirar primeiro e falar depois. – Olhava para Fernanda que não sabia o que fazer. – Depois não diga que eu não tento negociar.

Em um movimento rápido, Davis saca sua Glock de sua cintura. Atirava para cima dos seus oponentes e andava para trás. Enquanto as garotas corriam para trás dos outros carros, os torcedores também corriam para alguma proteção, não sabiam que as balas eram não-letais. E o próprio atirador fugia para buscar cobertura, sabia que não poderia brigar com os três ao mesmo tempo ou mesmo correr por causa de seu pé. Conseguia ver suas protegidas dali, escondidas no carro adjacente e abaixadas.

- Dêem um fora daqui! – Jogava as chaves da BMW para elas. – Vão pra casa! Eu me viro!

Levantava mais uma vez e atirava mais três vezes, um em cada um dos torcedores para retardá-los, e baixava novamente e ainda via que as jovens estavam estáticas em meio ao tiroteio.

- Vão! Agora! – Gritava como uma ordem para elas. Fernanda arrastava a amiga para longe, cumprindo a vontade do vigarista.

Ao perceber que elas iam embora, respirava mais fundo e conseguia pensar um pouco. E levantava novamente, e atirava para cima do rubro com um facão. Até que todas as balas da Glock haviam acabado, e ele corre mancando e agachado por de trás dos carros, o máximo que pode em direção de Cnossos. Sua corrida não era rápida o suficiente para despistá-los.

Jogava a Glock para longe, e exageradamente tentando despistá-los.
 ******

Os três amigos se abaixavam devido ao tiroteio, Everton, o mais baixo dos três e que carregava o facão foi atingido de raspão por uma das balas na bochecha. E agora queria matar mais ainda aquele homem, no qual seu empregador mandou Nicolas, o torcedor morto do trem, eliminar. Ganharam poderes para poderem ser alguém naquela maldita cidade sem oportunidade, para aqueles que só sabiam tomar as coisas alheias.

Everton, Nicolas, Wallace e Maicon, sempre foram amigos desde infância. Parceiros de crime, e agora monstros. E por vingança iriam aniquilá-lo, quem quer que fosse. Escondiam-se das balas lançadas em cadencia, até que o barulho ficou mudo, e não passou depois de uma simples saraiva de “clics”. Era a vez deles atacar, Wallace com a barra de ferro; e Maicon com a corrente deram a volta no carro do qual viam as balas.

Passavam finalmente até onde Davis estaria, mas o mesmo não estava. Eles não acreditavam que ele teria fugido, até que vêem o barulho da BMW sendo ligada, e de lá viam apenas a ruiva atrás do volante. Uma das acompanhantes de sua vítima, logo era também sua vítima.

Everton mandava os outros irem em direção da saída com um gesto violento e nada sutil, enquanto ele próprio mataria as indefesas garotas, ou deixaria uma viva para diversão dos rapazes, Everton achava que mereciam. E ia correndo em direção da ruiva.

Um tiro vinha na direção do nada, acertava Maicon em cheio na mão dele, que explodia em um sangue verde brilhante. Era Davis um pouco mais distante, próximo ao muro, com a Desert apontada agora para Wallace. Que tratava de pular para trás de um carro.

A mão de Maicon começa a crescer, primeiramente a substância verde forma sua mão para logo em seguida a carne cobrir a mão fluorescente e macabra. O processo não é agradável, a dor que ele sente é intensa.

- Fala sério! Por que ninguém tem o poder de trocar de canal quando piscar, ou de fazer aparecer café?! – Davis atirava mais uma vez, dessa vez no peito. E Maicon caia, em um sangue verde que o sujava e ao mesmo saia dele.
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Ao mesmo tempo do estampido, em que Everton interrompe sua corrida para encontrar com a ruiva, a mesma fugia do veículo. Ao ver que sua vítima fugia, corria atrás dela, esperando que seus companheiros dessem conta de seu alvo principal.

A fotógrafa corria para o centro do estacionamento a área mais vazia do terreno, onde não podia escapar de maneira alguma da visão de seu perseguidor com um facão. Não conseguia despistá-lo, e ao olhar para trás, tropeçava em seus próprios pés e caia contra o acinzentado chão.

Everton parava de correr, e deliciava-se com o movimento da faca, pensava em feri-la, para apenas evitar a fuga. Para depois procurar a outra, apesar de pensar que ela teria abandonado a amiga a própria sorte. Decidiu que cortaria uma perna dela, ao mesmo tempo em que Fernanda esgueira-se cada vez mais para trás.

Levantava a enorme faca perpendicularmente ao chão e em direção da jovem, apenas para logo em seguida a arma cair do chão.

Atravessado em seu pulso, uma flecha certeira, que realmente havia acertado-o. Fernanda havia soltado um grito. Tamanha era a precisão que a ponta da flecha havia cortado os tendões da mão do agressor. Ainda assim, mantendo a concentração, o agressor queria a jovem e dava um passo em direção a ela. E novamente uma flecha era disparada, e acertava na panturrilha da perna que avançara.

O líder do bando de aberrações desistia da idéia, pensava que aquela primeira flecha era de sorte e que podia ignorá-la, mas a segunda era tão precisa quanto a primeira. Não podia mais ignorá-la, tinha que matar tal atirador de flechas. Olhava para direção de onde viam, e mais uma flecha lhe acertava. Era a morena que ele pensava que havia fugido, em cima de uma árvore de um dos canteiros do estacionamento. Com a bolsa das flechas abertas e com arco em mãos. E estava pronta para resetar mais uma flecha.

O homem se preparava para alguma coisa, como se fosse receber um imenso impacto de dor. E era o que estava acontecendo, sua pele começava a rasgar dando lugar para um couro rígido e sua estrutura óssea começava a saltar de algumas partes, que pareciam chifres que também cresciam em sua coluna vertebral, o maxilar inferior dilatava-se com violência e forçava junto com os dentes que pareciam ter mais de uma fileira, quase um híbrido entre homem e crocodilo.

A arqueira estava estática, via aquilo e era diferente do que aparecia na TV, o cheiro mais próximo daquilo que sentia era de um bicho desenterrado debaixo de um bloco de concreto que fora banhado por formol industrial. Aquilo era biologicamente impossível, e ela tremia diante de tal aberração. E Fernanda estava estática, queria correr e não conseguia, fazia sinal da cruz incessantemente, era a única coisa que conseguia fazer.

Cris saia do transe que estava por ver a amiga naquele estado. E atirava novamente no peito daquela monstruosidade, mas antes a flecha atravessava o corpo e agora apenas a ponta de metal fincava. Continuava a atirar, mesmo percebendo que tal monstruosidade, voltava os olhos para ela. Corria em sua direção, atirava mais uma vez no peito daquele demônio com força e precisão, arrancava duas flechas da mochila que estava presa em um galho.

Sem usar o aparato para fixação e mira de flecha, colocava duas flechas na corda, uma presa entre o indicador e no médio, e a outra entre o dedo anelar com o mínimo. Qualquer arqueiro sabia que ter precisão com essa técnica era quase impossível, e que também haveria o risco dela deslocar o dedo mínimo e anelar, além da pressão maior que a corda do arco que poderia arrebentar em seu próprio rosto.

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Davis apontando a arma para o regenerador e o da barra de ferro, Maicon desmaiou de tanta dor que aquela substância em seu corpo, enquanto Wallace se escondia, atrás de algum carro. O vigarista vê que o que parecia o líder, corria atrás de uma de suas protegidas. Desistia de ficar naquele combate, e iria ajudar a ruiva. Até que quando começou a correr recebeu um golpe com a barra de ferro em seu estômago que o jogava para cima de um Astra. Não quebrara nenhum osso, porém o impacto era forte o suficiente para deixá-lo desnorteado, e ainda soltava a Desert que parava longe de sua vista.

Quando mal abria os olhos para focar seu mundo que estava embaçado, sabia que tinha que sair dali, pois ele sabia o próximo movimento. E saia correndo pela sua direita, ignorando a dor do golpe recente e do dedo recém-colocado. E no momento seguinte, o vidro do Astra trincava com o golpe direcionado na cabeça do homem de terno.

Ao sair da rota de colisão da arma de Wallace, pulava por cima de um Tempra cinza, caindo no chão com força, e ainda corria abaixado para um pulo mais longe, mas sempre abaixado procurando sua arma. Seu agressor estava logo atrás dele, mas um tiro poderia eliminá-lo, e ele iria ajudar as garotas. Havia achado a arma bem embaixo de um Audi, e metia a mão para pegar a arma, só que estava longe de mais. E desistia dela, o que foi uma sábia decisão, pois gritando com a barra de ferro Wallace a erguia com o mesmo fervor de um punhal pronto para sacrificar sua vítima.

E mesmo assim, por muito pouco, Davis consegue escapar. Porém o asfalto do local onde estava fazia um pequeno buraco. E corria novamente para longe de Wallace.

- Seu covarde frutinha, luta que nem macho. – Gritava Wallace, pois a única coisa que esse cretino sabia fazer era correr.

O vigarista cessa a corrida, e olha para trás com uma cara séria. Como se aceitasse o desafio do torcedor dos Rubros. E voltava lentamente em direção ao seu ofensor, com apenas os punhos cerrados e firmes.

Antes mesmo de chegar, seu oponente já corria para o ataque com a haste de ferro. Atacava horizontalmente, na direção de seu peito. Davis respirava fundo e em um movimento ritmado com o de Wallace, pegava a barra de ferro com a mão e o braço de seu oponente com a outra. Usando a própria energia de seu agressor, jogava-o no chão com o mínimo de força e o máximo de letalidade. Com o impacto no chão, o torcedor dos Rubros, soltava a barra de ferro, a qual, Davis segurava com firmeza e segurança. Quase como uma coreografia bem ensaiada.

E no mesmo movimento, seu rival caia no chão. E não acreditava que ele era capaz disso, estava com a barra de ferro, manobrando como se fosse realmente um artista marcial. Davis atacava novamente, atacando com a barra em direção a cabeça de Wallace, que foge dali, em mais um salto marcial.

- Eu tinha que pegar mesmo, o único que parece lutar bem! Que legal! – ironicamente dizia Davis, que se coloca para combatê-lo.

- Agora que tá lutando como macho, é?! Cai dentro maluco! – Saia do joelho dele, um osso do tamanho da barra de ferro que se fazia arma de seu oponente.

- Bem... Tecnicamente, macho eu acho um termo machista demais. E não é de meu agrado, mas cavalheiro me soa bem gay. Acho que lutar como “homem” seria mais apropriado, porém o que vai acontecer não é propriamente isso.

-Caralho! Você fala demais! E como assim “porém isso não vai acontecer!”? Você não é homem?!

- Eu sou, mas ela não! – Apontava para um ponto atrás dele.

Fernanda estava suja de graxa e fuligem, e com a Desert perdida de Davis, e Wallace ao virar, leva um tiro no meio da caixa torácica, que o fazia cair longe. Ao mesmo tempo em que Fernanda se desequilibrava com o tranco da arma, caindo no chão rapidamente.

- Tudo bem garotinha?! – Ele dava a mão para a ruiva se levantar.

- A Cris está com problemas, vamos! – Ordenava Fernanda enquanto Davis sentia um aperto no peito.

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Largava as duas flechas para cima do monstro que vinha em sua direção e errava as duas. Sabia que era um erro tentar, tinha tempo apenas para mais uma flecha enquanto ele investia, sacava o mais rápido que podia e disparava apenas com o intuito de acertá-lo.

No entanto, o couro da criatura era rígido demais. A flecha não entrava mais do que a ponta, ele chegara ao pé da árvore e a mordia. Vendo aquilo, Cristiane joga a bolsa das flechas para longe. Acaba caindo dentro da caçamba de uma caminhonete a frete que também estava estacionada no local.

O segundo abocanhar do que era Everton, fazia a árvore começar a pender. A morena pulava com mais pressa do que cautela. E por pouco não torce o pé, mas sente virar mais forte. E corre para onde estão suas munições, enquanto na terceira dentada a árvore caia.

Pulava um carro e se escondia dentro da caçamba da caminhonete, junto com a bolsa que jogava. Respirava fundo, tentava controlar a ânsia que lhe subira a garganta. Aquilo era aberrativo demais para ela própria, aquilo era antinatural, violava cada coisa a qual ela aprendeu. Colocava as luvas que usava para atirar, pois suas mãos suavam, eram luvas de cano alto que chegavam à metade do antebraço, e havia ainda cinco espaços o qual estavam sendo preenchidos por flechas pela bióloga. Além de encaixar mais uma flecha no arco pressionando a corda e ainda mantendo-se abaixada, esperando que a Fernanda e Davis estivessem bem.

Enquanto que Everton não conseguia raciocinar direito, via tudo vermelho e tudo que queria era matar e\ou esquartejar o máximo que pudesse. Queria apenas matar, não se lembrava de seu pai que era trabalhador e foi morto por um policial, não se lembrava de sua mãe e de como ela morrerá por causa de tuberculose, não lembrava que entrou na vida de crime para acumular dinheiro por um tempo. Tudo que ele era, havia se transformado em um monstro.

Tinha que matar, e não tinha a quem matar, com uma força monstruosa, virava um carro. Cristiane quando ouviu o barulho intenso, quase deu um grito, pois ele estava perto. E notará também que ele era praticamente cego e surdo, pois era quase impossível, não ouvir o barulho da mochila caindo e nem dela correndo.

Era uma oportunidade, porém tinha que se expor. O que ela odiava, mas teria que fazer para enfrentar aquele monstro que há perseguia. Via um carro caro a sua frente, e com um movimento rápido vindo de uma respiração profunda. A arqueira atirava a flecha no carro, bem no pára-brisa, disparando um barulhento alarme. O qual o monstro começava a seguir. Tirando mais uma flecha de uma de suas luvas, atirava no próximo carro, com o mínimo movimento, e mais um carro era atingido. O barulho era ensurdecedor, e atirava finalmente no poste próximo, destruindo a lâmpada, deixando aquela área à meia-luz.

Apesar da pouca iluminação, ele ainda era visível. Mirava com calma e precisão, talvez aquele fosse seu último tiro, e tinha que ser perfeito. Apesar dos fatores ao seu lado, odiava pressão, odiava ter que fazer algo com o pesado fardo de ter que acertar, obrigatoriamente.

Atirava novamente, e errava, se odiando por causa disso. Tentava pegar uma nova flecha, mas tremia, pois aquele monstro poderia, com o mínimo de inteligência humana, achá-la. Tinha medo de acontecer algo com ela, e com o que poderia ter acontecido com Fernanda. E se perguntava onde estava aquele vigarista do Davis, para aparecer no momento certo.

A BMW acende suas luzes e em menos de sete segundos alcançava os 100 km\H, atropelando a aberração que se prendia no capo do carro. Logo em seguida, freiava bruscamente jogando a fera para longe. E acelerava novamente, acertando-o contra uma parede de tijolos. Mais dois tiros são disparados na cabeça da criatura, que começa a virar novamente humana, e derrete na gosma esverdeada. Cris estava surpresa ao ver sua amiga e o vigarista saindo do carro junto.

A estudante de Biologia deixava o corpo cair no chão pesadamente, querendo apenas descansar.
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A Rua Brás Cubas estava bastante movimentada, principalmente às três da manhã. Já havia uma ambulância do grupo Savior, cuidando de Matheus e de Khazarin. Matheus estava só com leves escoriações e uma contusão enorme no pescoço. O qual era apenas enfaixado e os ferimentos limpos. Enquanto Khazarin estava sendo enfaixada na cabeça, devido aos danos que sofrera no carro.

Ambos sabiam que não podiam falar que lutaram com seres com poderes que eram naquele momento, gosma verde e fétida a qual alguns dos investigadores forenses pegavam uma amostra. Aquele dia nem havia nascido direito, enquanto isso, Larissa conversava com o chefe da equipe forense. Dizia com um enorme sono e ainda não tinha que falar com os dois.

-É... O que você está achando do seu primeiro dia? – dizia Matheus enquanto um dos pára-médicos passava a lanterna sobre seus olhos.

E Khazarin apenas atravessava seu olhar de desprezo para com seu parceiro, enquanto outro pára-médico terminava de enfaixar sua testa. E ainda trazia sua katana para seu lado.

- Começo a reparar que você não é muito de falar, eu acho?! – Matheus era novamente fulminado pelo olhar de Khazarin que não sabia diferenciar se era sarcasmo de sua fala sincera. Será que era verdade que ele gostava mesmo dela como amiga conhecendo em menos de duas horas? Ou era uma brincadeira sádica de perturbá-la ao extremo. – Vamos lá, admita que foi divertido? Bem... Bizarro e divertido!

A tenente começava a ir em direção dos dois policiais escoriados, caminhando com um pouco de sonolência em seus passos. Matheus sabia que era encrenca. Como explicar o que acontecia? Como explicar que os criminosos que os atacaram eram as poças verdes que estavam sendo recolhido pelos forenses?

- Bem, esses caras nos atacaram, nos defendemos e eles fugiram. Simples, não?! – Matheus sorria francamente, do mesmo tipo que Nathan, só que o “Cão” mostrava um sorriso com o dente da frente quebrado que era lembrança de sua época como agente carcerário.

A comandante do DAE olhava a cara de seu melhor agente, era a mesma cara do seu pior agente. O que era bem plausível, se não fossem seus instintos policial e feminino gritando que ele estava escondendo algo. Assim como ele apitava cada vez que Nathan começava a abrir a boca.

-E esse monte de catarro espalhado todo por aqui? – Larissa cruzava os braços olhando para os olhos de Matheus, que a olhava com cara de confuso. –Hatori, isso é verdade?

Khazarin acenava a cabeça afirmativamente, concordando com a história que era dita para a tenente, mesmo que ela tivesse pedido para falar tudo. Não iria denunciar um parceiro e aquela história era absurda demais.

- Vocês dois realmente me irritam! – Larissa dizia. – Só por isso, não vou liberá-los, vocês vão atender um chamado aqui próximo, no estacionamento de Cnossos. Vão agora!

Khazarin e Matheus se levantam e vão em direção da sua viatura. Ambos os policiais entram na viatura, e dessa vez Khazarin coloca o cinto de segurança. Fechavam a viatura, e iam até Cnossos.

- O pior que eu estava indo pra lá! – dizia o gigante para a meio-nipônica, com uma cara vitoriosa.
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Chegavam à porta do estabelecimento chamado Cnossos, a fila que se formava antes, era bem diferente da que se encontrava no momento, com quase ninguém. Apenas os seguranças e membros dos “Los Chicanos” que fugiam ao ver a única viatura, que era a de Cérberus por causa do adesivo colado em um dos vidros com os dizeres: “Aqueles que atravessarem essas portas devem perder toda a esperança”. Essa era a 25 – Beatrix, a única viatura que tinha esse poder.

Até mesmo os seguranças de Cnossos tinham medo da 25 – Beatrix, porque alguns eram policiais que trabalham como segurança para complementar seus orçamentos, abdicando de seu descanso e encontrar sua família, para dar conforto e dar uma vida mais digna aos seus filhos, mas Matheus “Cerberus” Murdock fazia aquilo porque lhe dava prazer limpar as ruas de Andaluzia, construindo um futuro melhor para sua filha.

Ao sair, Matheus carregava um cassete e sua calibre 12 na cintura e outra apoiada no ombro. Khazarin saia pelo outro lado carregando sua katana e pistola. Os próprios seguranças guardavam suas armas perante aos detetives do DAE.

- Muito bem, meu Brasil Varonil! Em quem eu tenho que atirar? – Matheus perguntava aos seguranças, de maneira aberta e descontraída. Reconheceu de cara Alessandro, com seu cavanhaque bem aparado, ambos comemoraram o nascimento da filha de Matheus. O outro era Cláudio, que tinha uma cicatriz na sobrancelha, por causa do estouro do cativeiro da filha de um juiz sequestrada.

- O tiroteio brabo já teve, chefe. – dizia Alessandro. – Acho que foi por causa daquele seu antigo parceiro. Danificou um monte de carros, tinha até flechas, acredita?! E um bagulho verde nojento. E ainda...

- Tá falando do Nathan? Ele esteve por aqui?! – Perguntava em uma felicidade exaltiva, enquanto Alessandro afirmava que sim.

- Então o nome daquele viadinho era Nathan, ele vai ver só! – A feição de felicidade de Matt, se tornava ódio puro para com o segurança sem pescoço, e ia com passos pesados em direção do mesmo.

- Se tentar fazer, falar ou mesmo pensar em fazer algo contra o Nathan, eu juro que vou dar um jeito de você se aposentar por invalidez, e vou acabar com a sua vida fértil para que gente como você não propague seu DNA por ai. Fui claro? - Pegava-o pelo colarinho e o levantava com as duas mãos deixando acima do chão. Olhando para ele direto nos olhos com uma raiva espumante. – FUI CLARO?!

Khazarin abria os olhos enormemente, assustada, porém sem transparecer o que estava sentido. Agora sim, ela entendera o apelido de “Cérberus”, ele levantava um cara que deveria pesar a mesma coisa que ele, se não mais. Com força e sem fraquejar. Como um verdadeiro monstro assassino.

- Desculpa! Desculpa não quis dizer isso! – dizia o segurança, perdendo toda sua arrogância e ar de superioridade medíocre e ganhando um ar de cordeiro amedrontado.

- Calma, chefe. – dizia Alessandro abaixando o braço de Matheus lentamente, e junto com os braços descia o segurança que era jogado um pouco mais longe. – Ele é novato aqui em Andaluzia, ao que parece de onde ele vem, ele era “o foda”.

Matheus respirava fundo e andava até o estacionamento sendo acompanhado pelo segurança, e seguido um pouco atrás pela silenciosa espadachim. A qual fazia questão de pisar no rosto do segurança, e continuar seu caminho. O homem caído iria ofendê-la, mas ao perceber, Khazarin apenas a fulmina com o olhar e mostra em tom de ameaça uma polegada da lâmina de sua espada que reluzia.

- Baixa a bola, negão. Aqui em Andaluzia, quem não nasce com malandragem não frequenta a noite. – dizia Cláudio levantando o novato.
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A dupla de policiais e o segurança chegavam a cena do vandalismo, tiros, flechas e mais daquela gosma verde asquerosa estava espalhada. Aquele cheiro revirava o estômago de Alessandro e Khazarin, que lutavam para manter seus alimentos não-digeridos em seus estômagos. Matheus achava aquilo já natural, era tanto forte por fora como por dentro.

- Realmente, assim complica muito! – Matheus olhava aquela cena e tentava tirar alguma coisa plausível e calmamente olhava para ela, ignorando o cheiro do local e os barulhos que a ânsia provocava em seus companheiros. – Ale, pode nos deixar sozinhos?

Acenava com a cabeça afirmativamente e apertava a mão de Cerberus, e se retirava.

- Nathan realmente esteve aqui. – Abria um sorriso ao se abaixar no chão. – Aquele Nathan, fazendo suas bagunças por aí.

- E como você sabe que esse “Nathan” esteve aqui? – Khazarin pergunta com um lenço na boca.

- Esses copos de refrigerante enormes estavam cheios de café, isso é a cara do Nathan. Além das marcas de combate, as balas causaram mais amassados do que perfuração eram balas de borracha, a marca registrada dele. – O policial conhecia o seu ex-parceiro melhor do que ninguém. - Os tiros maiores são da Desert, da pra perceber pela aquela poça esverdeada. Só não entendi as das flechas?! Deve ser alguém que ele devia estar acompanhado.

- Afinal, quem esse o famoso “Nathan”? – Khazarin já estava curiosa pelo ódio da Tenente e da devoção do sargento em cima dessa figura quase mítica.

- Nathan, se é que esse é o nome dele agora. Foi o meu melhor parceiro e é meu melhor amigo desde a sexta série primária. Ele pode fazer você dar esse facão pra ele só na conversa, além de que ele é leal com quem ele chama de amigo e é capaz de dar a vida por qualquer um deles. Consegue sair de situações estranhas tão rápido quanto você saca essa sua peixeira aí! – Matheus tinha no rosto a afeição mais sincera pela pessoa que ele considerava seu melhor amigo.  – Ele só é meio perdido no mundo e bem rancoroso com umas coisas, ele não supera muito bem algumas coisas que aconteceram. – A feição do “Cão do Inferno” era de tristeza ao simples pensar do que aconteceu com ele.

- Hunf... – A novata virava o rosto e cruzava os braços, era estranho alguém demonstrar tanta afeição, principalmente um homem para com outro homem. Nem ela e seu irmão se gostavam tanto assim, pelo menos esse era o seu caso. Sentia um pingo de inveja desse tal de “Nathan”.

- Você iria adorar ele, conhece de tudo um pouco. Tem resposta pra tudo, e transforma o certo em errado. – Matheus, começava a procurar algo debaixo dos carros vasculhando como se estivesse procurando algo específico. – Um rapaz simpático extrovertido, uma graça! Achei!

Metia a mão fundo para debaixo do carro e puxava uma Glock 17. A arma preferida de Nathan. Era impressionante como ele conseguia perder essa arma, mas sorria de encontrar a arma ao invés do corpo inerte do amigo. Verificava a arma e via que estava descarregada, colocava a pistola na calça. Sobre a vista de Khazarin.

- Sabe que você está alterando a cena de um crime? – Khazarin agora olhava com reprovação para o sargento e falava diretamente sem rodeios ou hesitação. – Sabe que vou ter que relatar, né?

- Olha em volta, e veja o que Nathan encarou? Encarou três daquelas coisas de uma só vez, sabe-se lá quantos mais até sair daqui. – O sargento estava no processo de pré-raiva espumosa que tivera a pouco com um dos seguranças de Cnossos. – Me responde então, por que você mentiu pra tenente?

A loira não sabia o que dizer. Mentiu porque aquela história era absurda demais, mentiu para salvar a pele de seu novo parceiro, mentiu por lealdade. E isso por menos que o sargento sentia pelo seu protegido.

E virava novamente a cabeça para o lado, em uma menção que apesar de não apoiar o que fazia. Ele só agradecia com mais um dos seus sorrisos deixando à mostra o dente quebrado.

- Esperai aí! – Khazarin voltava o rosto rapidamente na direção do parceiro. – Três, você está contando o acidente no metrô?

- Não. To falando daqui mesmo, um ali no chão, um atropelado e prensado na parede. E um que foi arrastado para um porta-malas, o qual Nathan deve ter arrastado pra interrogar... Filho-da-mãe! – Matheus estapeava a testa, amaldiçoando seu pseudo-irmão por ser o cérebro da dupla.

Matheus corria para a viatura e entrava nela, Khazarin ia logo atrás. Colocando imediatamente o cinto enquanto entrava. Assustada com a reação de seu parceiro.

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Próximo das quatro horas da manhã, Yasmin Santoro, uma detetive da divisão de Narcóticos do DAE, pegou uma pista quente que talvez descubra quem é o chefão das drogas do submundo em Andaluzia. Yasmin era filha de um próspero comerciante, não precisaria trabalhar, mas assim como Matheus e outros do DAE, fazia aquilo por vocação. Morava no condomínio Edward Blake, mais precisamente no quinto andar, um condomínio caro que seu pai fazia questão de comprar para ela. Mas odiava depender de qualquer um para fazer coisas triviais.

Aproveitava para pintar seu apartamento, que tinha réplicas de algumas obras de artes, que sua irmã mais nova, Érica, fazia. Tinha quadro Os Três Músicos de Picasso, tinha até uma escultura do Cristo Redentor, do Pensador e do Buda Dormindo em um metro de estatura. Todas com plástico em cima, para evitar que sujassem com a tinta, mas não só as estatuas, mas sim todos os móveis e tudo estavam sendo coberto com jornais.

Suja, pintando a última parede de sua sala, pensava em pedir ajuda para Matheus sobre seu caso. Ele era o melhor do DAE atualmente para sair de qualquer situação, pois achou que uma hora seu disfarce havia sido descoberto por um dos traficantes que um dia prendeu. Poderia jurar que era só impressão, mas por via das dúvidas era sempre bom chamá-lo, antes que ele tivesse um novo parceiro, os quais tendem a enlouquecer.

Até que a porta é chutada violentamente chegando a quebrar a corrente que a prende, fazendo um imenso barulho, tanto que Yasmin larga o rodo o qual estava usando para pintar de tamanho susto. Via apenas um vulto negro entrando, e a golpeando na garganta com um soco direto. E logo, em seguida uma joelhada bem encaixada no estômago, fazendo-a cair em silêncio sem poder ao menos gritar.

Sem dar chance de reação, o invasor aplica um mata-leão sufocando Yasmin. Fazendo-a perder os sentidos, e arrastava o corpo inerte da detetive para a sacada do quinto andar. Colocava-a em pé, para fora da sacada, segurando-a firmemente, colocando suas mãos na sacada, como se ela mesma estivesse segurando fora da sacada.

Olhava para o rosto desmaiado dela, e a soltava em queda livre...


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