29.4.10

Capitulo 3: Assim, de repente.


“Estatuas e Cofres e Paredes pintadas. E ninguém sabe o que aconteceu...”

Maicon era filho mais velho de três irmãs, era o mais burro do grupo, o mais gentil, talvez o único que não desse para essa vida. A promessa de dinheiro fácil, sua vida difícil e ainda seus amigos caminhando por ela, foram os fatores que lhes convenceram, a fazer o maior erro de sua vida. Acreditar nas palavras de quem os tornou naquele jeito foi o maior erro deles.

Ao acordar com uma enorme dor de cabeça, lembrou que foi contratado para matar o tal cara de terno e cabelos cacheados, tudo que tinha era uma foto dele. Nicolas tentou resolver sozinho, e decidiu interceptá-lo no metrô até que eles viram que um dos exaustores do metrô explodiu em poeira. Logo Nicolas, que tinha poder de derreter as coisas, foi morto. E com um tiro desmaiara.

E estava acorrentado em uma cadeira de ardósia, algemado, e ainda envolto com fita multiuso extremamente resistente. Só tinha a boca e os olhos não vendados, para ver que estava em uma casa apenas com tijolos expostos e uma laje apenas que servia como teto, ninguém teria orgulho de morar em um lugar daquele. Mas havia um odor que o deixava em paz, como se estivesse em casa de manhã, quase podia ver sua mãe na cozinha, o clássico odor de café.

Não via a sua mãe, mas sim o homem que ele tentará matar. E o torcedor dos Rubros de Andaluzia urinava nas calças com medo.

- Acordou, Aramis?! Que bom, não daria para perguntar as coisas com você desacordado. – Davis estava sentado em uma cadeira de metal, geralmente encontradas em bares, vendo o café sendo feito na cafeteira sobre a mesa de plástico patrocinada por uma cervejaria. – Sabia que eu não sou muito fã de café de cafeteira, prefiro café feito na chaleira, parece que tudo que você coloca em uma água fervente é absorvido, deixando o café mais forte e encorpado.

- Não faça nada comigo, por favor! – Maicon chorava desesperadamente.

- Relaxa, Maicon. Se você me ajudar, não tem o que temer. Eu sei que você quer estudar, quer ser alguém e eu admiro isso. Agora para de chorar, porque você é um homem feito. Eu te soltaria, mas prezo muito pela minha segurança até descobrir umas coisas. – Enchia uma xícara de café enquanto falava com uma calma e obviedade de uma conversa de negócios.

- Você pode me ajudar? – Perguntava Maicon ao seu seqüestrador.

- Realmente, não sei, mas posso dar minha palavra de que eu vou ajudá-lo. – Puxava a cadeira de metal para próximo dele. – Assim como eu quero muito confiar em você. Gosto de confiar em pessoas que são diferentes de mim.

- Como assim?

- Eu tenho um sério desprezo por funkeiros e por torcedores de qualquer time. Nada pessoal, é preconceito meu mesmo. Não vou dizer que sou superior a ninguém, até porque me acho a pior pessoa da face da terra, mas pra falar a verdade, eu acho que só em a pessoa existir, ela já não presta. Apenas conhecendo mesmo como ela é, que eu considero uma pessoa. – Tomava um longo gole de seu café. – Só acho que vocês estragam o mundo com essa música, mas deixa pra lá! Vamos ao que interessa, quem mandou você me matar?

- Realmente, eu não sei. Juro que não sei. – Maicon falava o máximo possível de calma para superar suas gírias. – Quem arranjou o serviço foi o Everton, só conheci mesmo o cara que me deu esse poder.

- Então, você não é um Allien! Isso já descarta uma opção, e pelas minhas pesquisas, você também não é um ser espiritual. Só me sobra que você é um mutante! – Se recostava na cadeira de bar e saboreava seu café, o qual bebia feito água.

- Não, não sou isso. Sou gente! Ele me deu uma injeção da mesma cor que eu regenero, o problema é que eu não sinto mais que sou eu. Não sinto mais necessidade de respirar, não sinto fome, não sinto meu coração bater. – Virava o rosto de lado, e chorava lagrimas de sofrimento. – Talvez eu seja um monstro mesmo.

- Então somos mais parecidos do que eu mesmo esperava. – Tomava um último gole de café. – Se você é um monstro em corpo, eu sou um em alma. Tinha tudo para seguir minha vida, ser um “homem de bem”, e me tornei um monstro vingativo e preconceituoso. O que é pior, ser um monstro em corpo ou em alma?

Deixava a xícara na mesa e puxava uma faca, que começava a cortar a fita multiuso que mantia preso seu hóspede. Após cortar, pegava as chaves e abria os cadeados, e libertava-o das algemas.

- Isso se chama “voto de confiança”. Afinal, somos monstros em busca de redenção, e devemos ficar unidos. – Davis sorria para seu hóspede, que lhe devolvia o sorriso. – Agora vamos ao que interessa, conte-me tudo, adoro uma boa história.

 *******

- Já? É a quinta residência que nós visitamos, e o dia já está amanhecendo. – Matheus descobria que Khazarin tende a falar mais quando está irritada.

- Carma, mulé! Sabe quantos nomes o Nathan têm?! E eu aposto que ele deve ter mais uns vinte nomes. – Matheus pegava um caderninho com todos os nomes que ele conhecia do amigo e pedia para Khazarin cruzar as informações com residências adquiridas e que estivessem sozinho. – Afinal, ele é um “fantasma” como Larissa diz.

- Só falta mais uma casa, a de “Roberto Dias”, que é próximo ao Santa Marta. Peraí, isso não é uma área de risco de Andaluzia? – Khazarin tentava ser discreta ao termo da comunidade carente de Santa Marta.

- Se refere à favela de Santa Marta? – Matheus olhava para ela, vendo uma falta de jeito da palavra preconceituosa que era “favela”. – Favela não é nada mais que o tipo de madeira que eram feitas às casas, é o mesmo de não me chamar de “grande”. Tenha em mente que preconceito que é por causa de um atributo você julgar a pessoa.

Antes que Khazarin pudesse falar algo, uma voz ecoou dentro do carro. Um chamado da central.

- “25 – Beatrix, 14 – Madalena, 9 – Emilia. Chamado na Rua Machado de Assis, Edifício Edward Blake. Possível Suicídio, prioridade Duo.”

- 25 – Beatrix, respondendo ao chamado.

- “Esse cretino do Cerberus atendeu o chamado?! A coisa é boa! 9 – Emilia respondendo ao chamado”.

- Esses viados do Beatrix e do Emilia estão na jogada. 14 – Madalena respondendo ao chamado”.

- Mas hein?! Por que de tanta hostilidade entre vocês? – Khazarin olhava com curiosidade para seu parceiro.

- Beatrix, Madalena e Emilia, são as mais velhas e resistentes viaturas, dadas apenas aos policiais mais “eficazes”. Sempre ficamos disputando qualquer coisa, e geralmente somos os assuntos das delegacias. São Julio Gordon e André Amadeus na 9 – Emilia; Gabrielle Solast e Leandro Constance na 14 – Madalena. Nossa prioridade sempre é Duo.

- Duo? – Khazarin com um olhar de curiosidade de criança.

- Duo é a ordem de que você pode ignorar a ordem se estiver em outra prioridade e, geralmente, estamos. A Alfa é para largar qualquer coisa e ir até o chamado. E a menos que esteja uma explosão no presídio, você tem obrigação de ir para lá correndo. – Virava a viatura em plena mão dupla. – Se descumprir ou você encara a corregedoria ou a Tenente.

A cara de Khazarin era no mínimo cômica, estava boquiaberta de maneira exagerada pelas diversas animosidades e relacionamentos dentro apenas da polícia. Eram como se todos se conhecessem e mesmo ela fazendo parte daquilo, ainda sim estava deslocada, mas estava em uma missão e tinha que cumpri-la.

- E não vamos atrás do tal do Nathan? – Indagava Khazarin, voltando ao seu clássico rosto inexpressivo.

- Prioridade Duo. E temos tempo para isso, afinal, Nathan está vivo. Ele vai acabar procurando por nós! – Sorrindo francamente para sua parceira. – Agora, vamos falar um pouco de você, afinal de contas, somos parceiros, já lutamos contra criminosos. E só sei o seu nome, se é que é o seu nome mesmo.

Khazarin suspirava profundamente fechando o laptop que usava para a pesquisa de Matheus. Colocava o aparelho em sua respectiva bolsa. E começava a olhar para a janela vendo o sol da manhã raiando e iluminando a cidade cinza, e ao contrário da noite hostil e deserta que ela conheceu. O dia era das pessoas de bem e trabalhadores formais, via mães vestidas para o trabalho carregando filhos uniformizados.

- Nasci na cidade de Porto dos Recifes, sou filha de imigrantes japoneses e alemães. – dizia Khazarin olhando vagamente a porta dos estabelecimentos sendo abertas.

- E por que se tornou policial logo de Andaluzia? Por que não em Porto dos Recifes? – indagava Matheus.

- Saí de casa, trabalhei de várias coisas, e em minhas andanças disseram que minhas habilidades seriam ideais para a polícia. – Khazarin perdia o olhar na paisagem errante da cidade.

- Realmente, você é muito boa como sushi-bar com essa peixeira. – Matheus lembrava o que ela fez com o carro e com o pé do agressor. Sua perícia era assustadora, assim como seu rosto com um sorriso sádico durante a batalha.

- Não é “peixeira”, o nome é katana.

- Cara-a-tapa?

- Katana!

- Aritana?

- Desisto, chame do que dizer...

Sorria francamente, não sabia se ele entendeu mesmo ou se era uma diversão sádica dele se fazer de idiota, deixando os outros idiotas. Mas começava a gostar de sua presença, era como um irmão que zelava sem amolecer. Poderia se acostumar com essa vida.

-Chegamos ao Edward Blake! – Olhava para fora olhando o novo trabalho.

Edward Blake era um prédio enorme, casas dignas de famílias burguesas, concentradas na Euzébio Queiroz, que era a rua com mais pessoas de classe média-alta e\ou alta de Andaluzia. Com sacadas enormes e vidraças temperadas e à prova de som. Ao saírem os policiais viam repórteres e curiosos sobre a faixa amarela, alguns se voltavam para os dois policiais que viam próximo ao local, a 9 – Emilia e a 14 – Madalena.

Alguns repórteres iam na direção dos dois policiais recém-chegados, mas vendo o tamanho de Matheus, que usava sua cara de amedrontar, desistiam da ideia. O olhar funcionava com excelente sucesso. E ninguém se atrevera a mexer com Khazarin que tinha a mão no cabo da espada, um dos repórteres olhava estarrecido a beleza da meio-nipônica, e ao mesmo tempo sendo cutucado pela companheira de profissão.

Passando pela faixa amarela, encontravam mais uma vez Vinny. A cara de desapontamento do enorme policial era evidente. Dizendo “Ah, não!” E batendo em sua própria testa. Esqueceu que Vinny ficava com as piores funções, como conter os curiosos e mesmo os repórteres, e com sua presença insuportável, ele era realmente bom nisso.

- Sargento! Sargento! – Acenava Vinny histericamente estando a menos de cinco metros. – O senhor veio?

- Que pergunta idiota. – murmurava a loira.

- Se quiser que aquilo não se repita, comece a falar. – E erguia a mão para terror do pobre policial.

- E que tal eu falar? – Vinha um policial maior que Matheus, negro e de cavanhaque sem um cabelo sequer. Músculos inchados como os de Matheus, e com um olho roxo. Era Julio Gordon, da 9 – Emilia, acompanhado de seu parceiro, com enorme óculos, mexendo em um smartphone constantemente, era André Amadeus. Raquítico perto de Julio, mas um verdadeiro gênio forense.

- Ora, ora se não é o “Grande Julio”. – Matheus se aproximava, uma das poucas vezes que olhava para cima para falar com alguém. E explodiram em um abraço, que tirava André de seu transe com o seu aparelho. – E você, corujito? Como está?

- Bem, bem longe do Nathan de preferência. – Soltava um meio-sorriso e ajeitava os óculos que escorregavam pelo seu nariz.

- Tá vendo o que o seu nerd de estimação fez com o meu?! Tenho que levá-lo ao Nerdshop para um banho nerd! – dizia Julio bagunçando o cabelo cheio de gel do parceiro.

- Prendam seus Nerds porque o meu tá solto! – Sorria lembrando-se de quando o Nathan e ele eram uma dupla.

-Ora, ora senão são os maiores baitolas que representam a lei. E o maior nerd-gay que tem na Homicídios. – Gabrielle chegava, uma loira com enorme raiz preta, olhos de quem já sofreu de tudo que podia e sobreviveu. Um corpo de dar inveja a grande parte das mulheres em Andaluzia. Não por ter volume nos lugares certos, mas sim por ter um corpo firme, e corpo de uma adolescente de dezesseis anos. Seu andar era convidativo, como o andar de uma garota de programa. – E quem é a novata? Você está chifrando aquela santa da Alice?!

O olhar de Gabrielle foi de quase fulminar Matheus, e Khazarin firma a mão na katana. Enquanto Leandro coloca a mão na pistola que estava na sua cintura. André dá um passo para trás, vendo que iria acontecer. Julio ria da situação e Matheus entrava como pacificador.

- Calma, todo mundo. – Levantava a mão o homem com dois rifles de calibre 12 na cintura. – Ela é a garota da Larissa, sabe como é, substituta do Nathan.

- Ah tá! – Todos uníssonos largam sua posição defensiva, exceto Julio, o qual não ficou na defensiva.

- Vamos lá, quem quer apostar? – dizia Leandro, com cabelos sempre bem penteados e um ar de malandro, que pegava seu caderno de anotações.

- Na frente da novata, não. – Leandro recebia um tapa firme de sua parceira.

Khazarin arqueava a sobrancelha não entendo muito bem o que acontecia, mas sentia que o clima de hostilidade havia acabado e desapertava a mão do cabo da espada, mas não a largava.

- Afinal de contas, o que diabos estamos fazendo aqui? – dizia a loira não-natural para o resto da equipe. – Por que chamar as melhores equipes da Narcóticos, Homicídios e o DAE?

- O que eu consegui saber é que alguém pulou do prédio. – dizia Julio. – Foi o que o Vinny me disse.

- Provavelmente foi um burguês emaconhado o qual o pai deve conhecer a alguém do alto escalão pra dizer que foi um suicídio. – dizia André sem tirar os olhos do smartphone.

- Ele me assusta! – diz o apostador da Narcóticos.

- A todos nós... – dizia o enorme policial afro-descendente.

- Não foi por isso que eu os chamei. – Um homem com um terno impecável, um ar de soberbo e autoridade que chegava a assustar. Cabelos grisalhos e fartos bem penteados, olhos de um azul tão claro que beiravam ao branco. Acompanhado de uma grava xadrez azul com preto. Era Michael C. Hall, um líder obstinado por manter a ordem diurna em Andaluzia. – Mas em parte você está certo, investigador Amadeus.

Todos batem continência, incluindo Khazarin que não sabe quem é, mas bate continência pela impressão que ele lhe deixou. Nenhum deles se atreve a olhar em seus olhos diretamente. Ele era o atual secretário de segurança, escrevendo mais de cinco livros que misturavam todos os ramos de direito aplicados a sua própria experiência de agente da lei. Além de em seu tempo de atividade policial, caçava Serial Killers pelo país.

- Vou explicar o caso uma vez e não me interrompam por nada. – A voz dele era como a de um professor rígido e com certeza de saber. – Yasmin Santoro era conhecida por vocês, todas as evidências apontam que foi suicídio, mas meu instinto policial diz que não, conhecia Yasmin desde seus sete anos. E isso é um favor pessoal que vocês farão para mim. Se for um suicídio ou não o laudo caberá a vocês, mas precisamente a equipe do DAE, fui claro?

- Sim, senhor. – Uníssono novamente, os melhores de Andaluzia, pelo menos em fama e em campo, estariam no mesmo caso.

- Relatem diretamente a mim, sem escalas. Dispensados. – O secretário saia com sua escolta de seguranças, acompanhado pelos inúmeros repórteres do local. E nenhum dos seis policiais daquela força tarefa saiu da posição de sentido até que o Secretário fosse perdido de vista.

Leandro e Gabrielle caem em prantos, Julio coloca a mão na boca para evitar que o queixo caísse. André passa as mãos no cabelo desmanchado o penteado cheio de gel. Matheus estava estático, a única que não entendia era Khazarin, por ter chegado ontem e por ainda não ter dormido.

Khazarin olhava perdida para seu companheiro, que percebe que a novata não entendia nada e coloca-se a explicar.

- Yasmin era da Narcóticos, era uma infiltrada. Os policiais que entram no meio desses cretinos para quebrar seus esquemas de dentro. Todos sabiam que ela estava em alguma coisa, mas era confidencial. Era uma ótima policial, e uma amiga melhor ainda, e agora está aqui embaixo ao que parece. – Apontando para o cobertor que cobria a vítima. – E quando pegam um de nós, tem sempre retaliação. Uma coisa que eu odeio, mas que é necessária.

- Agora que eu queria que o Nathan estivesse aqui. – dizia André com o cabelo bagunçado. – Ele saberia por onde começar.

- O que Nathan diria é “começar sempre pelo básico”. – dizia Matheus. – André e Julio, cuidem dos nerds forenses e os pressionem em busca de qualquer coisa. Gabrielle e Leandro dêem uma olhada por aí em volta, já que ela era do seu departamento, vocês devem ter os mesmos contatos e descubram no que ela andava se metendo. Eu e Khazarin vamos ver com os familiares e conhecidos dela esse tempo de investigação.

Todos os cinco batiam continência para “Cerberus” e saiam para cumprir suas ordens. Khazarin olhava para Matheus e estranhava a postura séria e militar do companheiro, que não exibia nenhum sorriso, e via que ele estava perdido em seus pensamentos.

- Acho que era isso que Nathan diria... – Sussurrava o enorme policial e ia em direção do prédio, fazendo o sinal da cruz ao passar pelo cadáver da amiga. E sendo seguido por Khazarin, como uma sombra silenciosa e mortal.

 ******

7:03 am.

O sol invadia o quarto de Cristiane, batendo em sua vista causando um enorme incomodo. Ela colocava o rosto para debaixo do travesseiro. Até que perceberá que estava em sua cama, em seu quarto. Tivera um sonho estranho, como nunca tivera. Acidente de metrô, monstros esverdeados, bares, e um homem que ela nunca viu na vida.

Até que se colocava sentava na cama, e via que estava com a mesma roupa de faculdade, e ainda sua amiga dormindo no colchonete colocado do lado de sua cama. Sente o pé doendo como nunca, e via que os pulsos e dedos estavam arroxeados, era como se ela fizesse seu pior treino de arqueria. Além, do principio de tendinite atacando-lhe as articulações dos braços.

Agora com os sentidos em pleno funcionamento, ouvia o barulho do aspirador de pó fora do quarto o qual estava com a porta fechada e com o fundo musical de Claudinho e Bochecha, cantando “Conquista”. Já presumia que era a sua companheira de apartamento que começava a irritante faxina de sábado, que nunca a deixava acordar atrasada aos treinos de arqueira que eram às nove da manhã.

Passava por cima da amiga, com cuidado para não pisá-la. Fernanda estava encolhida e dormindo o sono dos justos, mesmo com o sol em seu rosto e o som do aspirador com a música não lhe faziam nem um gesto de incomodo.

Ao abrir a porta, via que o som era pior do que pensava. E fechava a porta rapidamente para não acordar a amiga. E via Luiza, passando o aspirador de pó como sempre fazia. Luiza tinha uma pele muito branca com cabelos ruivos (verdadeiramente ruivos, não como os de Fernanda que eram tingidos), acompanhado de sardas da mesma cor de seus cabelos, magra com curvas suaves, dignas de uma modelo de passarela. Ela tentava falar alguma coisa para a morena, mas com os sons diversos e sua cabeça cheia, Cristiane ouvia apenas um blá, blá, blá em câmera lenta.

Com um cara de mau-humor involuntária que sempre fazia ao acordar, como se estivesse arrependida eternamente de sair da cama, puxava a tomada que conectava a TV e o aspirador de pó. Via a amiga gesticulando sua insatisfação com sua ação, mas novamente: blá, blá, blá em câmera lenta. Sabendo que não conseguia dar atenção a amiga, ia ao banheiro para tomar banho e praticar a higiene diária matutina.

Sentia sua pele pegajosa e suada, coisa que a irritava. E sentia seu cabelo cheirando a café, ela não gostava de café, porém dessa vez lhe causou boas sensações. E colocava-se para dentro do banheiro para finalmente acordar, recuperando a consciência apenas depois de algum tempo que a água do chuveiro caia sob seu corpo. E finalmente voltava a ser o que era e começava a organizar a mente.

Tentava lembrar, mas sua última lembrança era o monstro sendo atropelado pela BMW dirigida por Davis. Se é que era mesmo o nome dele, deveria ser. Ela mesma não via outro nome para ele, as dores melhoravam com a água morna, mas as marcas, não. Realmente quando falavam para ela não sair de noite e nem chegar muito tarde era verdade. Será que aquilo acontecia toda noite? Será que poderia encontrá-lo de noite?

Já novamente arrumada com sua roupa de treino saia do banheiro ainda com suas perguntas ecoando na sua mente. Secando ainda o cabelo, parecendo mais querer tirar as idéias e perguntas que brotavam de sua cabeça. E via ainda a companheira de casa limpando, e agora que percebia via marcas negras de passos com fuligem.

-Agora da para explicar o que aconteceu de madrugada. Dormi preocupada com você, sabia? – Luiza olhava com seriedade para cara da amiga. – Não sabe que não da pra dar bobeira na rua aquela hora?

- Pior você que chega no dia seguinte. – Cristiane tentava desviar o assunto.

- Mas eu tava com o Pablo, e você sabe disso! Não me venha com essa! – A ruiva realmente estava muito preocupada. – Você chega sem fazer barulho e ainda carregada? E acha que tá tudo bem?

- Como assim carregada? Você disse que não me viu chegar!

- E não vi. Mas olha o tamanho desse pé! – Mostrava a marca nítida de pegadas indo e voltando em direção de seu quarto. – A menos que você ou sua amiguinha calce 42. O mais estranho que a porta estava trancada quando acordei. Você trancou?

- Eu não tran... – Cristiane corre para o banheiro para mexer em sua calça, e perceber que suas chaves não estavam mais lá. – Aquele cretino do Davis. – Chutava a porta com violência e revolta.

- Davis, então o nome do cara que tá me dando o dobro de trabalho, né?! – dizia Luiza. – Pelo menos ele é bonito?

- Nem sei se é o nome dele mesmo, e ele não é bonito, ele é um vigarista que agora tem a chave da nossa casa. – Dizia a morena.

- Uia, deu a chave pra ele. Tá amarradona, né?!

- Qual é a parte de “roubar a chave” você não entendeu?

- Bem, ele carregou você e a baixinha aqui pra dentro, deixou as malas ali no canto. E ele trancou a porta quando saiu. Só faltou mesmo ele limpar as patinhas. Tirando isso tá tudo certo.

Em parte a amiga tinha razão, ela estava em segurança e em casa.

- E aí, não vai me atualizar das fofocas de ontem? – dizia Luiza sentando no sofá e parando um pouco a limpeza.

Antes que pudesse abrir a boca o canal que passava o “melhor dos bailes funk”, muda para um noticiário local de Andaluzia. Com sua reportagem de última hora.

“Bom dia! Metrô descarrilha deixando a cidade parada, e trânsito lotado. Vandalismo no estacionamento de uma casa noturna. Ataque a policiais na rua seguido de tiroteio. E suicídio de uma jovem de classe alta. Essas são as principais noticias da cidade aqui no Andaluzia Agora.”

- Er... Bem... Digamos que em metade das notícias, eu estava lá!

 ********

- Fique um tempo para não dar bandeira. Tem café, pão e requeijão, sirva-se lentamente. E já sabe, se me ajudar essa casa é sua. – Dizia Davis quase saindo da casa. – E tenha um bom dia! - Acenava para Maicon e batia a porta.

A casa ficava no bairro de Jardim Primavera, um subúrbio perto do morro das Alturas. Uma favela com um enorme pavilhão da polícia militar que atuava como pacificadora. No morro das Alturas havia uma simplicidade de pobreza e segurança ao mesmo tempo. Ninguém estranhava o vigarista por lá, naquele local ele era um dos sócios da ONG: “Todos por uma infância melhor”, um fato era que Davis adorava crianças.

Davis saia com um copo de refrigerante enorme de algum fast-food lotado de café. Precisava mais dele do que nunca, não dormia desde ontem à noite. Se fosse apenas um dia de pesquisas tudo bem, mais foi um dos dias mais agitados que ele já sentiu. Sua cabeça latejava quando parava entre um gole e outro. Por mais que não quisesse admitir precisava dormir. E entrou em seu Honda Civic verde-musgo, quando crianças vieram em sua direção e recebiam paçocas que estavam no porta-mala, como pagamento por vigiarem seu carro.

Deixava o café no porta copos do carro e ligava o som do carro na CBN, que era seu resumo realmente imparcial de notícias. Colocava a chave na ignição, enquanto deixava a voz quase mecânica do locutor lhe dizer a repercussão do que ele mesmo aprontava. E saia sem rumo, mas para longe de Yucatan que pudesse.

Tentava colocar a mente no lugar, dirigindo, as notícias eram sobre o que ele aprontou na noite passada. Com alguém especulando sobre terrorismo em Andaluzia. Estando mais para um professor universitário que só saí de dia, ou fica trancado na faculdade nas aulas noturnas. Tinha que passar em seu traficante de informação preferido, e pegava o celular.

Ao ver, olhava sua caixa de mensagens com mais de vinte ligações perdidas e todas com caixa postal de voz. Atendia a primeira deixando no viva-voz:

- “Nathan, aqui é o Matt! Preciso falar com você, é urgente.”

Todas as ligações eram um pedido igual, mas com vocábulos diferentes. Sabia que poderia ser apenas um convite para uma de suas famosas conversas de bar. As quais eram divertidas e ao mesmo tempo estressantes, ou poderia ser que ele precisasse de sua ajuda, começava a digitar para rediscar, até que uma notícia prende a sua atenção.

“Hoje de manhã, o suicídio de Yasmin Santoro, filha de Edgar Santoro banqueiro da Santarodré. Pula do quinto andar da sua casa. O secretário de Segurança, Michael C. Hall comparece no edifício Edward Blake, e delega a investigações a cargo de Matheus Murdock, conhecido heróis na rebelião do presídio Yolanda.”

- Realmente é sério demais. Shadow pode esperar. – virava o carro quase que na contramão para seguir ao Edward Blake, quase causando um acidente de trânsito.

 ******

Luiza estava chocada com todos os acontecimentos, que Cristiane falava. Fernanda já havia acordado e ido para o banheiro. E a morena amarrava o coturno que usava nos treinos, uma bota resistente e antiderrapante, junto com uma blusa lilás e uma calça jeans surrada. A bolsa já estava pronta, além de uma roupa reserva.

- Você entrou na Cnossos?! E você nem me chama?! Que amiga, hein. – Luiza cruzava os braços e bufava.

- Fui praticamente arrastada para lá, por aquele maluco. E eu ainda fiz um curativo naquele cretino e coloquei o dedo dele no lugar. E como ele me agradece? Roubando a minha chave! – Cristiane terminava de passar o último laço do coturno, de maneira raivosa.

- Fala sério! Se ele me fizesse entrar na Cnossos eu daria todos os meus potes de maquiagem. – Luiza sonhava em entrar na Cnossos, nem mesmo que fosse para ser garçonete, mas todas as tentativas foram em vão. – Espero mesmo que esse carinha passe aqui de novo e ME SEQUESTRE!

- E o pior que não consegui pensar em nada para escrever, que ódio daquele carinha. - Fernanda saia do banheiro com a mesma calça de ontem e com uma blusa emprestada que estava pequena na bióloga. Penteando o cabelo, e torcendo para que o cheiro de graxa tivesse saído de seu cabelo.

Todas eram conhecidas de escola, eram diferentes entre si. Cristiane sendo a anti-social da turma, Luiza sendo a popular e Fernanda sendo a estudiosa e inventiva, mas coexistiam em uma amizade fraterna equilibrando em seus extremos. Terminando de estar arrumadas, Cristiane preparava-se para ir ao treino, Fernanda iria também e escreveria algo sobre a vida da desportista.

- Vem com a gente? – indagava a morena.

-Não, tenho ensaio de fotos pra aquela propaganda de perfume. – Luiza era modelo fotográfico e de passarela, não do tipo internacional, mas aquele rosto que você com certeza você já viu em algum lugar. – Duas horas para escolherem três fotos no máximo. Que vida! Não é... Garota do suco de Laranja! – As ruivas, tanto a natural quanto a tingida riam. Enquanto a morena olhava com uma cara de ódio mortal.

Graças ao seu desempenho lhe rendendo a medalha de bronze nas olimpíadas nacionais na categoria arqueria e sendo bastante nova, conseguiu um patrocínio do grupo Alimentício e de Suprimentos Energéticos Red Point, que a bióloga achava que Red Point era nome de prostíbulo. Faziam-lhe beber suco de laranja, o qual ela nunca gostou e comer barras de cereais, que ela acha veementemente que são as lascas de lápis unidas com mel. Fazia aquilo apenas pelo patrocínio. Achava degradante, mas era um mal necessário.

Antes que novamente alguma resposta fosse dita a campanhia tocava. Luiza atendeu a porta e viu quatro policiais com suas fardas pretas na porta. Imediatamente ficava assustada.

- Com licença, as Senhoritas Andallas e Medina se encontram nesse recinto? –Perguntava o policial com óculos de grau e asiático.

Ao ouvirem isso, Cristiane e Fernanda ficam congeladas, Luiza fica sem reação e olha sem sentir para as amigas. Dando a certeza que ambas estavam no apartamento.  Todos os quatro puxam armas e invadem a residência, Luiza foi imobilizada com uma chave de braço. A Bióloga e a Fotografa eram jogadas agressivamente no chão e sendo algemadas.

- Cristiane Andallas e Fernanda Medina, estão sendo presas por ameaça de terrorismo, vandalismo e destruição de patrimônio particular e público. – dizia o policial asiático apontando a arma e logo em seguida dizendo seus direitos.

Sabiam que estavam metidas em sérios apuros...

 ******

- Eu juro que não foi suicídio e nem fui eu. Tive aqui no dia seguinte, tivemos uma briga feia. Ela tacou o prato que eu dei pra ela do nosso primeiro encontro, o qual espatifou. Tanto que eu juntei os cacos pra tentar colar depois. Parecia que ela fazia só de maldade, ignorando tudo que aquele prato representava pra mim. – dizia o jovem aos prantos sendo interrogado no apartamento de sua falecida namorada. – Não sabia que da noite pro dia seria a última vez que eu a via. Tanto que liguei para ela depois, pedindo desculpas por pressioná-la daquele jeito. E dizia que tava tudo bem e “na maior alegria”. Era o que ela sempre dizia quando estava tudo bem.

Matheus estava sentado no outro lado da mesa, com sua cara sóbrea e anotando tudo com a maior integridade possível. Apenas coletava informações como dizia os manuais para depois montar o quebra-cabeça, mas doía ouvir tudo aquilo, queria chorar pela amiga morta, queria chorar por ele, pois nem imaginava perder Alice daquele jeito ou de jeito nenhum.

Enquanto Khazarin olhava a casa sem tocar em nada, via a tinta fresca na parede, alguns peritos colhendo vestígio de DNA. Tratando como estatísticas a morte de uma pessoa, tentando ignorar o que aquela morte acarretaria. A dor que ela proliferava, a perda de um futuro, as vidas que ela poderia mudar para melhor ou para pior, a perda de uma força de mover o mundo. E agora seriam nada mais que uma ficha.

- Acho que isso é tudo, só peço que não saia da cidade. – dizia Cerberus para o namorado desolado.

O homem acenava com a cabeça, apertava a mão do enorme policial e ia embora pela porta. Os peritos também se retiravam para estudar as amostras colidas no local. Deixando apenas no local os dois policiais-líderes no caso. No lado de fora, Vinny impedia qualquer outro de entrar, na verdade ele estava ali para não incomodar.

- Estátuas e cofres e paredes pintadas. E ninguém sabe o que aconteceu. – Era Nathan na sacada do prédio, suando e mesmo assim tentando não perder a compostura. Antes que Matheus pudesse abrir sua cara de felicidade, Khazarin já o atacava com um soco direto no rosto. Davis se jogava no chão e tentava dar uma rasteira nela. E em um movimento de acrobata ela salta para cima da sacada. Antes de se virar colocando a mão na sua Katana Hatori vê em seu rosto a Desert prateada de Nathan em seu rosto. – Novatos na minha época ficavam na defensiva, mas isso é um absurdo.

- Kha! Esse é o Nathan que eu tanto me refiro! – Abraçava o amigo tirando-lhe do chão e o ar dos pulmões. - Não me dá mais noticias vagabundo.

- Matt. Ar. Faltando. – Realmente o abraço do amigo era praticamente o de um urso assassino em fúria, só que no caso era o amor fraternal do cão do inferno.

- Foi mal! – Matheus largava Nathan. – Que bom que você veio! Sabe o que houve com a Yasmin?

Khazarin descia da sacada curiosa com Nathan, esperava desde um nerd até mesmo um Matheus-Dois, mas ele era tão normal à primeira vista. E não tinha aparência do mega-detetive que seu parceiro citava e que todos temiam, mas conseguir superar sua velocidade de assassina colocando uma arma na sua cara. E ainda entrar na cena de crime mais famosa da cidade, era espantoso.

- Sim, fiquei sabendo. – dizia mais sério. – Tinha conversado com ela umas duas semanas atrás, ela disse que estava bem e que seria promovida. Não é um quadro de depressão, beirando ao suicídio.

- Peraí! – Matheus parava a conversa toda. – Como você entrou aqui?

- Você isolou apenas o andar do apartamento, eu fui ao quarto andar falei que era um dos investigadores e subi pela sacada.

- Você não tinha medo de altura?

- Eu AINDA tenho, mas ter medo já me impediu de alguma coisa?

- Tem razão! – dizia Matheus em uma risada forte.

A espadachim não acreditava na intimidade que eles tinham, chegava a ser assustadora. Como amigos de longa data, quase irmãos. Tinham um olhar de iguais e de admiração mútua. Era possível sentir uma enorme inveja daquela relação.

- Yasmin não faria isso nunca. Seria mais prático ela arranjar confusão por aí, e deixaria o Hugo com um bom dinheiro. Não com o facínora dos parentes dela. – dizia Davis pegando uma das luvas dos peritos. – E o que fizeram?

- Corrente quebrada, mas os vizinhos dizem que teve uma briga há alguns dias. E todo policial que se preze, consegue chutar uma porta dessas. E nenhum roubo, as digitais e as pegadas dizem que ela se matou mesmo. – O enorme policial dizia sistematicamente suas anotações.

- Sei, mas a Yasmin nunca foi do tipo agressiva. Ela era mais do tipo manipuladora, ela era cheia de segredos e adorava banheiros. – Nathan ia em direção do banheiro.

- Eu lembro, ela sempre dizia que os maiores segredos de uma mulher estavam no banheiro. Mas ela tava chapada de vinho, lembro que ela tem o estômago mais forte da Narcóticos. – Matheus ia atrás de Nathan, sendo seguido por Khazarin.

O trio entrava no banheiro, Nathan começava a pisar por todo o banheiro, e ouvia um barulho diferente, um som oco de algo solto próximo ao sanitário. Sentando em cima dele, puxava uma parte da cerâmica do piso. Que revelava um cofre eletrônico. E estava aberto definitivamente, Matheus e Khazarin estavam boquiabertos.

- Você é praticamente o Batman, só que sem a música queima-filme. – Matheus sorria para o companheiro. – Não é à toa que os peritos não acharam nada. Logo no chão do banheiro?! Isso é uma jogada de gênio!

- Mas o que tem aí dentro? – Indagava Khazarin.

- Nada, simplesmente nada! – O invasor de cenas de crime mostrava o cofre vazio. – Me ajude a tirar, vou levar isso pro Shadow.

- Você vai estar violando uma cena de crime! – Khazarin colocava a mão na katana ameaçando.

- Olha aqui, sua iraquiana de merda. – Nathan apontava o dedo para o rosto da semi-oriental. – Apanhei feito um desgraçado, quase morri, quase me urinei todo para subir até aqui, e tô meio de saco cheio dessas suas desconfianças. Se quiser causar mais uma morte, está esperando o que, mas eu conheço muito bem a burocracia do DAE, e sei que isso vai ficar a toa só com provas circunstanciais, e essa merda vai ser arquivada. Por tanto, se quiser usar isso contra mim, recomendo fazer isso agora!

- Kha, menos. O “N” tem razão, não quero que a morte da Yasmin seja em vão. Assim como eu faria o mesmo com você. – Matheus se preparava psicologicamente para deter a novata.

Ela tirava a mão da katana, e saia do banheiro bufando. Em desaprovação, porém não iria obstruir o que os dois iriam fazer.

Cerberus pegava o cofre enquanto o vigarista desconectava os fios. E colocavam com cuidado em toalhas enroladas. Nathan pensava em um jeito de sair do prédio cheio de policiais com um cofre e que não fosse pela janela e cinco andares de queda...

 *****

- Eu não sei de nada. – Cristiane dizia quase gritando ao policial. – Eu fui quase assaltada, quase seqüestrada, quase morta, quase agredida e levaram minha chave, e perdi mais de duzentos reais em flechas, e você me acha culpada?

A sala era de um azul claro, com paredes cheias de espelhos. Apenas luzes e uma mesa enorme com um gravador enorme e antigo. A morena estava agitada, nunca fizera nada ilegal para ser tratada daquele jeito. E aquele cara a irritava com aqueles olhos miúdos e inexpressivos.

- Pra quem não sabe de nada, você está “quase” encrencada! – dizia o policial asiático que anteriormente se identificou como Adriano Fong.

- E como vocês sabem que essas flechas são minhas? Pode ser de trocentas pessoas! Acha que só eu faço arqueria nessa cidade. – A arqueira já se exaltava levantando da cadeira.

- Até que não, só tem 23 arqueiros em Andaluzia, mas achamos pelo CNPJ, e achamos um pedido grande pela Red Point.  E adivinha quem é a única arqueira patrocinada pela Red Point? – O policial era enfático em dizer os fatos.

- Tá, isso não prova nada! Onde está meu advogado? Cadê meu telefonema? Onde está a minha amiga?

- Sendo interrogada assim como você, não precisamos deixar você ligar. Não durante as doze horas de averiguação. E em casos como terrorismo, podemos manter você aqui por três dias sem que sua “organização criminosa” saiba onde você está! – Então fale logo sobre Nathan!

- Não sei quem é esse Nathan! Eu já te falei o que aconteceu ontem, teve um acidente no trem. Fui assaltada, um amigo me ajudou e fomos parar em Cnossos porque ele era amigo do dono. Depois fomos para casa, estava meio tonta e não me lembro de nada. – Cristiane não sabia o porquê de estar protegendo Davis, deveria falar que era ele. Deveria falar que ele fez, mas não queria. Tinha que dar o benefício da dúvida para ele. – Eu não sei do que você está falando, eu e a Nanda fomos praticamente agredidas naquele estacionamento, e usei meu arco. Simples.

- E como você explica as mesmas balas de borracha encontradas em ambos os lugares onde você se encontrava. Acredite, esse cara não é seu amigo. – Adriano batia na mesa. – Deixa eu te contar uma coisa. Esse cara foi negociador do DAE, um dos melhores policiais, até que por culpa dele, cinco policiais morreram dentro do prédio de polícia. Tirando que eu mesmo tomei um tiro na perna, a qual foi amputada. E ele é um traficante, um mercenário aproveitador.

- Não sei se esse cara é esse “demônio” que você diz, mas ele me ajudou no estacionamento e no metrô, e não vi ninguém fardado pelas redondezas, para proteger as pessoas. As vidas das pessoas não valem nada à noite para Andaluzia. Agradeço por aparecer esse mercenário aproveitador. – A estudante de Biologia não sabia dá onde tirou aquele discurso. Logo ela, que nunca foi boa com as palavras.

- É o que veremos! – Adriano Fong sai da sala esbravejando, e batendo a porta. Enquanto Cristiane sentava novamente e deitava na mesa, usando os braços como travesseiro.

O asiático entrava na porta ao lado, encontrando a Tenente Larissa sentada de braços e pernas cruzadas de olhos fechados pensando profundamente e controlando a respiração deixando-a quase imperceptível. Com uma roupa social azul escuro e de saltos que só mesmo uma mulher bastante adaptada poderia usar. Fazia jus ao apelido mesmo sendo aquela rocha, era uma Donzela de Ferro.

Adriano na mesma hora batia continência para seu superior. A qual abria os olhos e mandava apenas ele descansar.

- E então?! – indagava a Donzela.

- A Srta. Andallas não está sendo muito colaborativa, a srta. Medina não consegue raciocinar e chora copiosamente, vai ser difícil ter a colaboração delas.

- Junte as duas, vou falar com elas. – Larissa se levantava. – Estarei na sala três, leve-as até lá!

 *******

A porta abre, Vinny que quase dormia acorda já puxando seu revolver, ao ver, era a novata loira que estava dentro do apartamento. Vinny chegava a ter quase uma ereção por causa dela.

- Você é o Vinicius? Não é?! – Indagava Khazarin.

- Pra você Vinny. Ops... Quero dizer, todo mundo me chama de Vinny. E sabe, você também... – O policial tremia e gaguejava não conseguindo formar muito bem as palavras.

- Er... É que o Sargento pediu que eu encontrasse a Gabrielle, e trazê-la até aqui. Eu iria, mas sou nova na cidade e me perderia fácil. Você poderia fazer esse favor pra mim? Como uma cortesia profissional? – Khazarin estava apoiada na porta entreaberta o que valorizava suas curvas.

- Agora mesmo! – Vinny ia pelas escadas correndo.

Ao abrir a porta, mas um pouco, e via Davis logo atrás da porta. A qual olhava com raiva e desprezo para o ex-negociador do DAE.

- Não me olhe assim! Apenas trabalho com o que tenho disponível, e não tenho culpa de homem ser tudo trouxa. – Davis olhava para o corredor e andava com cuidado.

- Isso foi baixo, manipular uma pessoa pelos seus instintos mais baixos de reprodução. E ainda me usando como mulher-objeto. – A meio-nipônica não acredita que ele manipulava todos a sua volta para conseguir o que queria.

- Você não assiste muita TV mesmo, não é?! Isso acontece mais do que você imagina. – Chamava o elevador.

- Eu não disse que ele era uma graça?! – Passava Matheus com o cofre nos ombros.

Khazarin arqueava a sobrancelha quase como dizendo “esse é o lendário Nathan”, e bufava de braços cruzados; mas ela mesma tinha que admitir que conseguir sair com evidência daquela não era coisa simples. Entravam no elevador social, onde dariam de cara com os repórteres. Para ela, era burrice sair com evidência enorme daquela em meio a câmeras, mesmo que tivesse um lençol. Mas a cara de Nathan parecia a mais tranqüila, junto com a de Matheus que parecia achar tudo aquilo normal. Fechava os olhos e torcia para que não fosse expulsa da polícia.

Chegavam ao andar térreo, e Nathan se escondia na lateral do elevador, desaparecendo da vista de repórteres e de qualquer um fora do elevador. No saguão cheio de repórteres com inúmeros flashs e câmeras que viam em sua direção. Ambos sendo fotografados e inúmeras perguntas investidas aos dois, que eram sumariamente ignoradas.

Matheus dizia que a grande caixa enrolada com panos, eram ferramentas da equipe forense. Que não podiam ser mostradas por segurança e ética profissional. Até que a 25 – Beatrix apareceu para salvá-lo, dirigido por um policial com o colete da polícia de Andaluzia e de toca-ninja, um procedimento muito comum, para que não sofressem retaliação os que moravam em áreas de risco.

Matheus colocava o embrulho no banco de trás e sentava no banco da frente, no banco do carona. E a loira sentava no banco de trás, tendo como companheiro, a evidência recém tirada. A viatura arrancava com os outros policiais que participavam no cordão de isolamento e detiam os jornalistas mais ousados.

O motorista tirava a máscara e se revelava Nathan, que dirigia com um certo saudosismo sua ex-viatura. Cerberus sentia um pouco de ciúmes da direção da 25 – Beatrix, mas estava feliz que Nathan estava ali. Khazarin estava vendo que ela também era uma criminosa, no mínimo uma cúmplice.

- E agora? Vamos para onde? – dizia o enorme policial ao vigarista.

- Estava indo pro Shadow pegar uns relatórios, mas vamos lá de qualquer maneira para ele dar uma olhadinha. Sabe como ele adora esses misteriozinhos. – dizia o vigarista.

O celular do moreno tocava, e ele atendia no viva-voz.

- Funerária Brasil, só falta você. Bom dia, Ricardo falando.

- Sei que é você, Nathan. – dizia uma voz feminina. – É a Julia da forense.

- Fala minha perita preferida. O que tem pra mim?

- Acabei de tirar digitais e DNA de duas interrogadas que dizem ser culpadas pelo trem e pelo incidente do estacionamento. Uma morena alta e uma ruiva do meu tamanho. – informava Julia ao vigarista.

Nathan batia na testa, agradecia a informação. Não acreditava que a tenente empregaria tantos esforços para encontrá-lo. Olhava para a cara de seu ex-parceiro, que simplesmente mexia os enormes ombros e sorria. Khazarin, não entendia muito bem a linguagem verbal daqueles dois, mas sabia que novamente iria fazer algo que ameaçasse seu emprego.

A 25 – Beatrix da uma curva ilegal quase causando um acidente. Indo pela mão-dupla, e acelerava em direção do prédio de segurança.

 ******

Finalmente as duas amigas estavam finalmente juntas. Não acreditavam que por causa de Davis estavam ali, naquele local. Ambas não sabiam o porquê delas ainda o protegem. Não sabiam muito bem, mas sentiam segurança e confiabilidade em Davis. Apesar de inusitados atos, o mesmo não teve intenção de fazer mal a elas.

Mas não entendiam porque estavam juntas, de acordo com a Fernanda, que já foi a inúmeros casos de interrogatório como acompanhante para repórteres policiais, era mais lógico para saber de um crime esperar que os acusados caiam em contradição. Juntos, era mais para informantes ou quando os criminosos podiam fazer um acordo, mas raramente o DAE fazia isso. Era coisa mais pra Narcóticos ou para a Roubos.

De repente, a porta abria e entrava uma mulher, um pouco mais velha que as duas amigas. Só que vestida com um conjunto que custava mais do que o arco de Cristiane. E apesar de muito bela, tinha uma aura assustadora que causava arrepios na ruiva e na morena.

- Olá! Senhoritas Cristiane Andallas e Fernanda Medina. – Colocava uma enorme ficha na mesa do mesmo tamanho de uma enciclopédia, amarrada com diversos elásticos e em sua borda saiam fotos e pedaços de plástico, na pasta estava escrito “Nathan Winchester” com um enorme carimbo de confidencial. – Acho que vocês conheceram Nathan Winchester, ou seja, lá o nome que ele usou com vocês.

Abria a pasta e as duas interrogadas não conseguiam tirar o olho de tal pasta.

- Tudo aqui nessa pasta é o que encontramos sobre Nathan, Ian, Marcelo, etc... E tirando os feitos e a sua cara. Tudo é falso. Cada nome, cada histórico, cada nome, cada história, cada pai, cada mãe... Nada é verdadeiro nele, mas ele faz que todos nós pensemos que ele é verdadeiro. Pura história. – A voz de Larissa mostrava um verdadeiro asco sobre o vigarista sem nome. – Se ele é tão bom, porque se esconde, porque ele usa uma máscara? – Batia na mesa com uma violência sem igual. – E acham realmente que vocês têm o dever de proteger um cara desses?

 Larissa empurrava o enorme arquivo para que elas mesmas as vissem. E viam vários crimes, cada um muito conhecido e de algum jeito omitido, mas Fernanda lia muitas coisas no jornal, e algumas acusações eram falsas, sem prova nenhuma e ele era acusado como cúmplice até mesmo como mentor intelectual. Coisas absurdas de casos já fechados. Acusação até sobre um idoso que dançou em Cnossos e teve uma parada cardíaca súbita.

Mas antes que Larissa pudesse completar seu discurso, a porta reabre e aparece uma mulher loira de olhos que pareciam mudar a cada instante, variando entre o azul e o verde. Com uma pele alva delicada, sem marcas. O mesmo corpo e estilo de Larissa, mas de etnia caucasiana.

- Como você se atreve a interrogar minhas clientes sem a minha presença. – A voz dela era decidida e cheia de certeza.

- Luciana Rangel, sempre você protegendo aquele criminoso. Tenho nojo de advogados como você! – Larissa de colocava contra a loira com toda a sua aura policial.

- É Luciane. E eu não posso fazer nada pela sua frustração se você ainda acha que força e intimidação ainda resolvem alguma coisa. Se você não consegue prender Nathan, deve culpar sua incompetência e não a lei. – A advogada era enfática e ofensiva ao mesmo tempo.

- Sabe que elas são acusadas de terrorismo, se eu quiser, você nem poderá defendê-las. – Larissa se colocava desafiadora.

- Não com esse mandado. – Luciane tinha vontade de amassar tal mandado no rosto da Tenente do DAE.

Enquanto isso a arqueira e a fotógrafa viam o embate de palavras quase beirando a agressão física das agentes da lei boquiabertas, cada uma lutando com suas armas. E nisso as amigas sussurravam:

- Aposto dez centavos que essa loira foi mandada pelo Davis. – Sussurrava Fernanda.

- Você sabe que eu não entro em aposta que eu tenho certeza que vou perder. – respondia Cristiane em um sussurro igual.

- Ainda não sei como você conseguiu um mandado do meritíssimo Lopez. – Larissa sabia que o Juiz Lopez desaprovava condutas de criminosos e os que viviam “a margem da lei”.

- Felizmente o meritíssimo Lopez, compartilha comigo o mesmo entusiasmo pela justiça e pelo fazer o que é certo. – dizia Luciane.

- Pela sua cara, devo presumir que tipo de entusiasmo que você e o Juiz devem compartilhar. – dizia a morena com tom e expressão acusatória.

- Se quiser especular, fique a vontade; mas acusar um Juiz de ser manipulado sexualmente é uma cartada muito arriscada, não acha? – Luciane sabia que deixava em xeque.

- Sabe que reservo uma cela para o Nathan e todos os seus asseclas?

- Cuidado para não estar guardando a sua própria. – dizia Luciane e chamava as suas cliente para fora.

Ambas se levantavam e seguiam sua dita advogava, passando quase que debochadamente pela Tenente. Passavam pelo sargento Fong, que as olhava como se aquele não tivesse sido o último encontro. A advogada levava suas clientes para fora da delegacia onde um táxi a esperava.

Fernanda e Cristiane reconheceram o carro e olharam o motorista. Moreno, calvo com um aspecto inseguro. Era Luciano, o taxista da outra noite. E olharam com mais cuidado o carro procurando Davis, ou seja, lá qual for seu nome. E a advogada olhava rindo, pois sabia o que elas procuravam.

- Não, esse é meu táxi, o qual ele mandou para me buscar. – Sorria docemente. – Pelo menos não tive que tirar realmente um criminoso das ruas.

- Obrigada por nos tirar daquela situação. – Agradecia a arqueira, e a freelancer faz-tudo do Pauta Livre News, repetia a mesma coisa.

- Que nada, e você deve ser a Fernanda. O “Davis” pediu para eu lhe dar uma entrevista, liga para mim e marcamos algo. – Luciane dava seu cartão. – Agora com licença, pois tenho que acabar com o meu sono de beleza.

Luciane entrava no táxi, e todos acenavam se despedindo como antigos amigos. Cristiane reparava que acenava demais, e parava. Enquanto sua amiga continuava a acenar. Olhava até quando sua amiga iria acenar, e não parava. Até que uma viatura enorme com marcas de balas na carroceria, que brecava de uma maneira assustadora, imprevisível e perigosa.

Um enorme policial saia do banco do motorista, com um rifle calibre 12 na cintura. Mesmo Cristiane, que era a mais alta da dupla, se assustava com aquele “monstro” que saia do camburão. E da porta de trás, saia uma mulher loira com uma espada na cintura, dando cobertura para ele.

-Senhoritas Andallas e Medina, estão violando a lei de antivadiagem. Terei que levá-las presas. – dizia aquele troglodita enorme, amedrontador de músculos inchados.

- Vocês acham graça de humilhar jovens, não é?! – dizia Fernanda, já revoltada e com nenhuma noção de perigo. - Minha advogada acabou de sair!

Com um forte movimento de pulso, e passos medidos e habituados a fazer, Fernanda é imediatamente algemada com força e imobilização, quando a bióloga reagiu apontando o dedo contra o homem da lei, uma algema saia do nada, ele forçava a morena a virar com um puxão que quase a derrubou e algemava a segunda mão. Ambas não acreditavam que alguém tão grande podia ser tão forte. E eram arrastadas para dentro do camburão com rispidez, que a porta de trás estava já aberta pela loira, aonde os criminosos iam.

Eram jogadas sentadas pelo gigantesco homem, que soltava um sorriso que mostrava o dente da frente quebrado. E batia com violência a porta do camburão. Elas ouviam as duas portas da frente bater e o carro ligar. Temendo que fosse a vingança de Larissa.

Durante o desespero das duas, Cristiane sente o cheiro que ela não suportava, e logo ligou um fato a outro, poucos segundo antes de poder falar algo. Batiam no vidro reforçado, e era Davis com seu enorme de copo de café com um enorme sorriso.

Continua...

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